22.8.06

Anexo I

JANUS POR JANUS



Janus Mazursky é uma impessoa. Seu nome não consta em nenhum registro civil, policial, fiscal, comercial, escolar ou de qualquer natureza mantido pelo Estado. Oficialmente, Janus Mazursky não existe. A peculiar condição de pessoa inexistente lhe permite desenvolver seu trabalho teórico com invejável liberdade de ação. Alojado em seu refúgio secreto, protegido pelo anonimato, o escriba atravessa horas à fio escrevendo e pesquisando. A inexistência em relação ao Estado é sua característica mais útil à Fraternidade. Isso porque a primeira regra da Fraternidade é não falar sobre a Fraternidade. E a segunda regra da Fraternidade é NÃO FALAR SOBRE A FRATERNIDADE.
O próprio escriba não tem explicação para o mistério da sua inexistência, embora haja toda uma parte de sua vida da qual Janus Mazursky não tem memória. Diz a lenda que o escriba jamais dorme, concentrando sua produção em longas madrugadas insones. E estranhamente, há pessoas que o tratam por um outro nome. Como se ele fosse uma outra pessoa, essa sim legalmente existente. Uma pessoa cujo nome é melhor não revelar aqui, para não provocar mais confusão.
Se interrogadas, essas pessoas juram que o escriba na verdade pertence a uma família nordestina, vinda do sertão de Pernambuco há cerca de dez anos, vive na zona leste de São Paulo, pulando de emprego em emprego, até acomodar-se, vejam que absurdo, no próprio coração do sistema, como funcionário do Banco do Brasil. Dizem também que ele concluiu uma faculdade de Ciências Sociais e que atualmente estuda Filosofia na USP.
E dizem ainda que se trata de um corintiano fanático, freqüentador assíduo das arquibancadas do Pacaembu, além de cinéfilo inveterado, cultor do ritual das salas escuras, viciado também em rock dos anos 70 e escritor de ficção científica e fantasia nas horas vagas. Essas últimas informações são confirmadas pelo escriba, embora ele não saiba como alguém possa ter conhecimento disso. A veemência de certas pessoas em sua fantasia alucinatória a respeito de Janus Mazursky e seu falso nome é assustadoramente convincente.
Evidentemente, trata-se de um expediente da Fraternidade para proteger seus colaboradores e impedir que caiam nas mãos da Polícia do Pensamento. Sendo Janus Mazursky um teimoso autor de crimidéias, essa providência provou ser uma idéia das mais sábias. Arrastando esse tipo de existência marginal, o escriba conduz sua guerra solitária contra o sistema, uma guerra de guerrilha, um trabalho de formiguinha, tentando enxugar um oceano com colherinha, como um vírus na máquina, uma falha na Matrix, uma mosca na sopa, um profeta no deserto. Aquele que vem para confundir e não para explicar.
O objetivo desse texto, portanto, era explicar quem é Janus Mazursky.


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Daniel M. Delfino

06/07/2006

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