OS
ESTERTORES DA DEMAGOGIA PETISTA
Por novos métodos, e por mais ação para os
trabalhadorxs!
Karen
Carvalho
Daniel M.
Delfino
Precisamos
De Você.
Bertolt
Brecht
Aprende
- lê nos olhos,
lê
nos olhos - aprende
a
ler jornais, aprende:
a
verdade pensa
com
tua cabeça.
Faça
perguntas sem medo
não
te convenças sozinho
mas
vejas com teus olhos.
Se
não descobriu por si
na
verdade não descobriu.
Confere
tudo ponto
por
ponto - afinal
você
faz parte de tudo,
também
vai no barco,
"aí
pagar o pato, vai
pegar
no leme um dia.
Aponte
o dedo, pergunta
que
é isso? Como foi
parar
aí? Por que?
Você
faz parte de tudo.
Aprende,
não perde nada
das
discussões, do silêncio.
Esteja
sempre aprendendo
por
nós e por você.
Você
não será ouvinte
diante
da discussão,
não
será cogumelo
de
sombras e bastidores,
não
será cenário
para
nossa ação
O
espetáculo da “condução coercitiva” de Lula,
na manhã da sexta-feira dia 4, orquestrado pela fração
do judiciário que milita para o PSDB, em conluio com a TV
Globo e outros abutres midiáticos, reacendeu o debate sobre a
ameaça de “golpe” no Brasil e a necessidade de defender a
“democracia” contra o perigo da “direita”. Uma ampla camada
de simpatizantes da esquerda atendeu ao chamado e está se
posicionando sinceramente contra a perseguição a Lula
(e não apenas os burocratas da CUT, MST e outros movimentos
sociais cooptados, que o fazem por profissão). Os atos
marcados para o dia 13/03 e datas próximas, contra e a favor
de Lula e do PT, devem atrair mais gente do que as mini-festações
melancólicas do final de 2015 realizadas por conta do
impeachment de Dilma. Todos sabem que o governo Dilma está
morto e enterrado, incapaz de qualquer iniciativa própria, e a
verdadeira ameaça para os adversários do PT é a
possível volta de Lula em 2018.
Enquanto
o requentado Fla-Flu partidário de PT x PSDB mais uma vez toma
conta das redes sociais, perdemos desgraçadamente mais uma
oportunidade de discutir a fundo os rumos da esquerda brasileira.
Toda a discussão suscitada pelos acontecimentos em torno de
Lula é uma perda de tempo, uma vez que o “golpe” já
foi dado há muito tempo, pelo menos desde 2002, quando o PT
foi eleito para governar para os capitalistas, mas os trabalhadores
acreditaram que o o governo lhes seria favorável; a
“democracia” está sendo solapada diariamente pelo próprio
PT na forma da violência policial, da Lei Anti-terrorismo, da
repressão aos movimentos sociais, da perseguição
a ativistas e militantes, do genocídio indígena, etc.,
que mostram o quanto essa democracia favorece apenas uma classe
social (e deve ser chamada pelo nome: democracia burguesa); e tudo
isso só faz reafirmar que a “direita” é o próprio
PT, já que a opção pela gestão do
capitalismo não pode significar outra coisa além da
continuidade da exploração e da opressão.
Por mais
que tudo isso seja muito evidente, existe um setor de simpatizantes
da esquerda que fecha os olhos para esses aspectos da realidade e
insiste honestamente na necessidade de defender Lula, Dilma e o PT (e
é com estes que precisamos dialogar, não com os
burocratas que o fazem por profissão). Esse debate seria muito
fácil, porém, se se tratasse apenas de mera cegueira ou
fanatismo dos devotos incondicionais de Lula. Infelizmente nada é
tão simples, e as ameaças que pairam por trás da
ofensiva contra o PT são bastante reais. O ponto onde
discordamos de todos esses companheiros é que os perigos que
existem por trás da ofensiva contra o PT, por mais que sejam
reais e se voltem contra os trabalhadores, não são
justificativa para defender Lula e Dilma nem muito menos para apoiar
o PT. Ao contrário, os dirigentes petistas são os
responsáveis pelo crescimento dessas ameaças. Estão
sendo atacados pela serpente que eles mesmos agasalharam no peito.
Para não
sermos derrotados mesmo quando vencemos
A
tragédia e o dilema da esquerda é que, entra governo,
sai governo, com crise, sem crise, ela ainda não conseguiu se
desvencilhar da seguinte armadilha: uma derrota do PT para a direita
tradicional continua aparecendo como se fosse uma derrota da própria
esquerda e dos trabalhadores, mas paradoxalmente, uma vitória
do PT não é de forma alguma uma vitória da
esquerda e dos trabalhadores.
Uma
derrota do PT hoje para a direita tradicional fortalece as ideias e
projetos conservadores: aprofundamento do ajuste fiscal,
privatizações, cortes nos gastos sociais, retirada de
direitos, demissões, repressão às lutas,
retrocesso nos direitos humanos, genocídio da juventude negra
na periferia, genocídio indígena, ideologia
policialesca (“bandido bom é bandido morto”), tratamento
das questões sociais como caso de polícia, acusação
de “vitimismo” para descaracterizar as reivindicações
de mulheres, negros e LGBTs (e com isso permitir que tenha livre
curso a violência e a opressão contra esses setores),
uso de ideologias religiosas como justificativa para reforçar
a opressão e barrar avanços na liberalização
de costumes (proibição do aborto, das drogas, etc.),
defesa da ditadura militar, etc. Os atuais adversários do PT,
que estão festejando o espetáculo da “condução
coercitiva” de Lula, defendem exatamente essas ideias e projetos.
Uma
vitória do PT, por outro lado, fortalece as seguintes ideias e
projetos: aprofundamento do ajuste fiscal, privatizações,
cortes nos gastos sociais, retirada de direitos, demissões,
repressão às lutas, retrocesso nos direitos humanos,
genocídio da juventude negra na periferia, genocídio
indígena, ideologia policialesca (“bandido bom é
bandido morto”), tratamento das questões sociais como caso
de polícia, acusação de “vitimismo” para
descaracterizar as reivindicações de mulheres, negros e
LGBTs (e com isso permitir que tenha livre curso a violência e
a opressão contra esses setores), uso de ideologias religiosas
como justificativa para reforçar a opressão e barrar
avanços na liberalização de costumes (proibição
do aborto, das drogas, etc.), defesa da ditadura militar, etc. Esse é
exatamente o legado ideológico do PT no governo e do PT como
referência da classe trabalhadora brasileira desde o fim da
ditadura.
O leitor
não está lendo errado, as conseqüências da
vitória ou da derrota do PT são as mesmas. A
responsabilidade pelo avanço de ideias e projetos
conservadores nos últimos anos é do próprio PT.
A opção de governar para a classe dominante foi feita
pelo PT e as conseqüências não poderiam ser
diferentes. Um governo que acomodou Henrique Meirelles, Sarney,
Collor, Renan, Maluf, Cassab, Kátia Abreu, Joaquim Levy,
etc., não poderia resultar em outra coisa. A ilusão de
que o capitalismo periférico brasileiro poderia proporcionar
bem estar para todas as classes sociais, indefinidamente, sem
qualquer alteração profunda na relação de
subordinação ao imperialismo e na estrutura interna
autoritária da sociedade e do Estado brasileiro, desabou como
um castelo de cartas com a sucessão das crises econômicas.
A
suposta extinção da desigualdade social e o retrocesso
ideológico
Melhorias
pontuais em favor dos trabalhadores também existiram na época
do governo Sarney e seu plano cruzado, na época de FHC e seu
plano real, ou mesmo na época da ditadura e do “milagre
brasileiro”. Melhorias pontuais e temporárias são
parte da história do capitalismo e seus ciclos de crise e
crescimento. O critério para apoiar um projeto político
não podem ser a supostas melhorias sociais que o PT trouxe,
mas as mudanças estruturais. E essas não existiram! Os
milhões de trabalhadores que “saíram da miséria”
nos governos petistas já estão voltando, já que
não se tratava de um movimento permenente de mudança da
hierarquia do capitalismo mundial em favor do Brasil e sua população
e sim de um momento conjuntural favorável de crescimento das
economias que recebiam exportações brasileiras. Esse
momento já se esgotou e a margem de manobra do PT foi embora
com ele. Sem “melhorias” a oferecer, o que fica é o
discurso da meritocracia, o ressentimento pela perda da
“prosperidade”, o ódio e a desconfiança contra as
classes sociais subalternas.
O
resultado final do projeto petista de poder, portanto não
poderia ser mais desastroso. Os movimentos sociais foram
burocratizados e cooptados pelo Estado. As parcelas mais pauperizadas
da classe trabalhadora estão entregues ao completo abandono,
sem qualquer perspectiva de organização além das
facções do crime organizado que grassam na periferia,
tanto as que usam as armas como as que usam a Bíblia como
ferramenta de trabalho. As camadas médias estão
ressentidas com a perda do seu status sócio-econômico
por conta da crise, e põem a culpa no governo do PT e nas
esmolas distribuídas aos mais pobres. Quem se beneficia desse
ressentimento é a elite quatrocentona, cujo discurso associa
facilmente as esmolas dos programas sociais com “vitimismo”,
oportunismo dos “vagabundos”, corrupção, crime e
PT, manipulando essas camadas médias toscamente ignorantes e
criando assim o clima político propício e a força
necessária para esmagar o PT e de quebra jogar pela janela as
poucas conquistas sociais que restarem (o verdadeiro alvo do ataque).
O PT fez
os trabalhadores acreditarem que a cidadania poderia ser comprada com
cartão de crédito. Quando a orgia consumista se esgota
na ressaca do endividamento, vem à tona a impossibilidade de
combater a desigualdade social no interior do capitalismo. A crise
dissipa as ilusões de ascensão social e expõe a
ausência de projeto de sociedade, que o PT não soube ou
não quis construir. O discurso do PT no governo não ia
além do reforço ao individualismo, à
meritocracia, ao consumismo. Na ausência de um projeto de
sociedade, sobram os projetos pessoais estilhaçados pelos vai
vens da conjuntura econômica, buscando desesperadamente uma
tábua de salvação nos mais diversos subprodutos
ideológicos da bancarrota capitalista. Uma periferia
desesperada, sem acreditar que lhe puxaram o tapete da ascensão
social, e as camadas médias assustadas com os rolezinhos dos
pobres no shopping center, ambos convergem para o anseio por soluções
místicas e autoritárias: só Jesus e a Rota
salvam!
A
direita tradicional prontamente se apresenta para oferecer as
soluções autoritárias contra o “caos social”.
O discurso contra o crime, contra a desordem, contra a baderna, passa
a encontrar ampla audiência. Da mesma forma, o discurso
religioso fundamentalista e moralista, de controle dos corpos,
policiamento dos costumes, cerceamento do prazer, também soa
atraente. Habilidosamente, os ideólogos da direita fazem
desaparecer a diferença entre um protesto social contra a
miséria (um bloqueio de avenida) e as ações
individuais provocadas pela miséria (a escalada do crime), de
modo que a única solução para a baderna
generalizada passe a ser o recrudescimento da violência
policial. Os trabalhadores, manipulados pelo medo, pela ignorância
e pela falta de projeto e de alternativa, são levados a
endossar discursos e projetos políticos que se voltam contra
sua própria classe.
Defender
o quê, cara pálida?
Não
deixa de ser irônico que o encarceramento por corrupção
seja o tratamento final dispensado pela elite brasileira aos seus
mais aplicados serviçais. Nunca ela lucrou tanto como nos
governos do PT. Que o digam o agronegócio, as empreiteiras, os
bancos e até a mídia “golpista” (de 2000 a 2012, o
que significa uma década de PT, o governo federal despejou R$
5,8 bilhões em verbas de publicidade apenas na Globo, de um
total de R$ 10,7 bilhões – dados da Secretaria de
Comunicação da Presidência). Mas isso não
significa que essa classe social tenha alguma lealdade ao PT. Assim
que deixarem de ser eficientes na gestão do capitalismo, os
“companheiros” serão descartados. Agora que está
sendo chutado, o PT pateticamente se queixa da ingratidão da
classe dominante, e quer apelar para que os trabalhadores o defendam.
Depois de estar 13 anos no governo, executando o projeto da
burguesia, o PT quer nos fazer acreditar que a esquerda precisa
defendê-lo. O PT chama o MST e o MTST para defendê-lo,
depois de favorecer o agronegócio e as empreiteiras, negando
qualquer possibilidade de avanço na reforma agrária e
urbana. A base dos movimentos sociais é usada como bucha de
canhão para defender os mandatos dos burocratas petistas.
É
essa então a armadilha em que estamos e que temos que recusar.
Defender a continuidade do PT como referência para os
trabalhadores significa defender a continuidade desse mesmo projeto
fracassado. O fracasso do PT ainda aparece como uma derrota da
esquerda e dos trabalhadores, enquanto que a sua vitória
concretamente não é a nossa vitória, dissemos
acima. A explicação para esse paradoxo é que a
esquerda não conseguiu construir nenhum outro projeto
alternativo, independente e oposto ao PT. A derrota do PT ainda
aparece como derrota da esquerda, porque a esquerda tragicamente
ainda não conseguiu construir uma outra identidade separada do
PT.
O
projeto petista e o real significado de luta dos trabalhadores
Evidentemente,
não é fácil nem rápido construir um outro
projeto semelhante ao que foi o próprio PT na origem. O PT
surgiu da covergência de uma série de lutas sociais que
vinham sendo travadas desde o fim da ditadura. Confluíram para
a formação do PT: o lento e paciente trabalho de base
de ativistas inspirados na Teologia da Libertação,
atuando durante muitos anos nos bairros, nos movimentos de moradia,
por melhorias mínimas como o asfalto de ruas, constução
de creches, postos de saúde, escolas, a ação
semelhante entre os trabalhadores sem terra no campo, o movimento
contra a carestia, movimento estudantil, movimento pela anistia, a
atividade de intelectuais de esquerda, os movimentos de mulheres, de
negros e LGBTs, as correntes que vinham da luta armada, as
organizações trotskystas e a retomada das greves e do
sindicalismo combativo. Todas essas forças contribuíram
para a formação do PT.
Mas na
disputa entre projetos políticos no interior do partido acabou
prevalecendo o projeto dos sindicalistas, de uma atuação
reformista, economicista e imediatista. As tendências
socialistas e revolucionárias foram gradualmente isoladas e
por fim expulsas do partido. A partir da década de 1990, esse
projeto suplantou a combatividade, a organização de
base e a disputa político-ideológica, buscando
transformar o partido numa ferramenta eleitoral para Lula. A vitória
desse projeto somente viria em 2002, quando a elite já estava
suficientemente convencida da adaptação do PT. O
partido já tinha deixado de ser uma força contra o
sistema para ser uma força do sistema.
Se hoje
os simpatizantes petistas defendem os governos de Lula e Dilma com o
argumento de que esse era “o governo possível”, que “não
há correlação de forças” contra a
burguesia, que “não há como” impor medidas mais
populares e mais hostis ao empresariado, etc., se hoje tudo isso
acontece, repetimos, é por opção da própria
direção do PT. O PT era a direção da CUT
e a referência para os demais movimentos sociais. Cabia ao PT
defender nos organismos da classe uma política de ofensiva e
de mobilização em defesa das reivindicações
dos trabalhadores, dos explorados e oprimidos. Ao contrário,
foi a própria direção do PT que optou pelo
caminho oposto, pela conciliação de classe, pelo
“sindicalismo cidadão”, pela desmobilização,
pelo abandono das lutas, por deixar de lado o método da ação
direta, pelo esvaziamento das instâncias de base, pelo fim da
organização nos locais de trabalho, pela burocratização
e fim da democracia nos sindicatos, por deixar de fazer qualquer
disputa ideológica e por defender a possibilidade de melhorias
no interior do capitalismo.
O PT
ressignificou o que é a luta dos trabalhadores. Deixou de ser
a mudança do capitalismo e passou a ser a busca de acomodação
no interior do capitalismo. Nada mais além disso pode ser
feito pelos trabalhadores e para os trabalhadores. O fracasso do PT
leva ao descrédito a luta pelo socialismo e todas as demais
lutas sociais, contra o racismo, o machismo, a LGBTfobia, etc. Tudo
isso passa a ser enxovalhado e ridicularizado, a partir da confusão
que se faz dessas lutas com o projeto do PT.
A crise
de alternativa e a desqualificação da luta dos
trabalhadores
Essa
opção foi feita depois da campanha eleitoral de 1989,
uma campanha que polarizou enormemente a sociedade e trouxe um
sentido de pertencimento e identificação para imensas
parcelas dos trabalhadores que se engajaram e participaram. A partir
dessa campanha a direção do partido percebeu que
poderia chegar ao governo pela via das eleições. Mas
para além dos aspectos internos da política brasileira,
o que determinou a opção do PT foi a mudança na
conjuntura mundial a partir da queda do Muro de Berlim e da URSS.
Como se acreditava que o regime que existia naqueles países
era socialista (mas não era), a conclusão que se
impunha era de que o socialismo tinha fracassado e qualquer tentativa
de ultrapassar o capitalismo estaria também condenada ao
fracasso. Logo, a única coisa que restava fazer era tentar
administrar o capitalismo de maneira mais “humana” e mais
favorável aos trabalhadores. E foi isso que o PT se dedicou a
fazer.
Entretanto,
nem a URSS e os países que seguiam seu “modelo” eram
socialistas, nem o capitalimo tem condições de oferecer
um futuro para a humanidade (nem sequer de ser “humanizado”,
atenuado, administrado, etc.). Mas a escolha de administrar o
capitalismo que foi feita naquele momento traçou um caminho
sem volta para o PT, com cujas conseqüências agora
arcamos. O abandono da luta direta, da combatividade, da
independência de classe, da mobilização, da
organização de base, da democracia nos sindicatos e
organismos dos movimentos sociais, da disputa de ideologias e
projetos de sociedade; tudo isso em prol da transformação
do PT em instrumento eleitoral viável para alçar os
burocratas do partido à condição de gestores do
capitalismo brasileiro, conduz em linha direta não só à
corrupção e degeneração do próprio
PT, mas também ao crescimento da direita tradicional que hoje
ameaça o PT e os trabalhadores.
Conforme
assinalamos acima, não existe vazio ideológico. No
vácuo do fracasso do projeto petista, prolifera o discurso da
ultra-direita e sua defesa oportunista de soluções
autoritárias. O retrocesso ideológico está
combinado com o retrocesso intelectual. A atividade dos intelectuais
de esquerda que contribuíram para a constução do
PT, construindo conhecimento científico a serviço da
luta de classes, foi substituído pela atividade de acadêmicos
que produzem discursos auto-referenciados, centrados no próprio
discurso. A pós-modernidade cria uma localização
a partir da qual o discurso opressor na prática não
pode ser superado, já que não há mais relação
entre o discurso e uma base social concreta. Os nexos que permitem
entender as mais variadas formas de exploração e de
opressão estão sendo desfeitos por um discurso que nega
explicitamente a existência de qualquer nexo totalizador de
inteligibilidade do real. A crise da alternativa socialista é
uma crise de alternativa da humanidade.
O
fenômeno com o qual estamos nos deparando agora é a
conseqüência de uma verdade cruel e dramática: não
existe meio termo possível entre capitalismo e socialismo. Ou
se opta por um ou pelo outro. Achar que é possível
optar por um meio termo, como fez o PT, vendendo a ideia de que é
possível humanizar o capitalismo, administrá-lo,
atenuá-lo, etc., e toda essa ladainha que já estamos
ouvindo há décadas, leva a um beco sem saída. O
capitalismo e suas crises levam a um aprofundamento da miséria
material e espiritual em todas as suas formas, guerras entre países
e guerra social entre as classes, violências de todos os tipos,
individualismo, ignorância, fanatismo, ódio, etc. É
nesse caldo nefasto que o Brasil está submergindo depois de 13
anos de governo petista, tudo por conta da opção
equivocada de administrar o capitalismo.
Por um
projeto socialista para o atual momento histórico
Superar
a crise em que o PT afundou a esquerda brasileira só é
possível por meio do relançamento de um projeto
socialista. A esquerda precisa superar os limites da atuação
economicista, sindicalista, reformista, imediatista e eleitoralista
que caracterizou o PT. É preciso construir uma prática
e uma teoria totalizante, que aborde os indivíduos concretos
em suas múltiplas demandas concretas, sejam eles assalariados
de qualquer categoria, moradores da periferia, mulheres, negros,
LGBTs, indígenas, trabalhadores rurais, estudantes, etc.,
relacionando todas essas demandas concretas ao capitalismo e
oferecendo uma alternativa socialista. Um projeto socialista
relançado tem que construir uma nova forma de se relacionar
com os trabalhadores, implantando na prática cotidiana do
movimento relações de participação
democrática real e vivências as mais igualitárias
e plenas possíveis. Somente assim pode ser formar uma nova
consciência socialista para o atual período histórico.
Se a
esquerda quer sair dessa armadilha e deixar de estar submetida à
imagem do PT, deixando de sofrer as conseqüências da
falência do PT, e criando uma contraposição a
todos aqueles projetos e ideias nefastos da direita tradicional, é
preciso criar uma nova identidade. Um novo projeto de esquerda
precisa ir além da prática reformista, economicista e
imediatista que caracterizou o PT, à qual até mesmo as
correntes revolucionárias que existiram no interior do partido
de alguma forma se submeteram. As ilusões reformistas e
eleitoreiras reproduzidas pelo PT têm que ser descartadas. A
esquerda tem que apresentar um projeto totalizante que trate o
trabalhador não apenas como assalariado, que se interessa
apenas por salários e horas de trabalho, mas como ser em busca
de emancipação contra todos os aspectos da sua
alienação.
Os
principais projetos criados por fora do PT nas últimas décadas
também fracassaram, e é preciso que se faça um
balanço muito sério disso também. Se um projeto
com a abrangência que teve o PT não se cria de uma hora
para outra, as principais organizações de esquerda que
existem por fora do PT também não nasceram ontem e já
têm tempo de estrada suficiente para produzir algo muito melhor
do que fizeram.
O PSTU
(legalizado como partido há mais de 20 anos, desde 1994) se
converteu numa mini-burocracia sindical de esquerda, mais preocupado
em acomodar seus dirigentes nos aparatos sindicais em pacífica
convivência com a burocracia cutista e governista do que em
revolucionar os organismos dos trabalhadores e organizar a luta. O
PSOL (fundado há mais de 10 anos, em 2003) se converteu numa
mini-burocracia eleitoral, com um programa vago de críticas
pontuais à política econômica do PT (e não
ao conjunto do projeto de gestão do capitalismo) e defesa
abstrata da “ética”, tentando reeditar o PT reformista da
década de 1990 e não o das lutas da década de
1980. O PCO não tem outra função além de
atacar o PSTU e as demais correntes da esquerda, e na prática
do movimento funciona como auxiliar do próprio PT e da CUT. O
PCB não consegue superar sua herança stalinista.
Toda uma
miríade de organizações menores não
consegue construir uma alternativa viável, em parte por estar
doutrinariamente presa a fórmulas e discursos retirados de
clássicos do marxismo-leninismo-trotskysmo (isso quando não
reciclam coisas ainda piores, como os grupos stalinistas e maoístas
que ainda existem), sem a capacidade de fazer uma análise
marxista concreta da situação concreta atual. A
esquerda se recusa a fazer um balanço das experiências
do século XX, separar o joio do trigo e empreender um esforço
teórico e prático de superação dos
métodos empregados até hoje. No interior da própria
esquerda reina a desorientação e a perda de referências
de classe e de projeto.
Ousar
lutar, ousar vencer
A falta
de trabalho de base, de disputa ideológica, de enraizamento
nas lutas, faz com que a esquerda não tenha base social
própria entre os trabalhadores e não consiga apresentar
uma alternativa de projeto político. Com isso, fica refém
de alternativas igualmente superestruturais e igualmente equivocadas:
embarcar no Fora Dilma, Fora Todos (que acaba se colocando, mesmo que
negue, ao lado da oposição burguesa, como faz o PSTU,
os morenistas e parte do PSOL) ou descaradamente defender o PT (como
faz o PCO e parte do PSOL). A única força capaz de
derrotar os projetos da oposição burguesa não
serão as instituições do Estado, que trabalham
para a mesma burguesia, mas a própria organização
da classe trabalhadora! É essa organização que é
preciso construir.
Por
falar em trabalhadores, estes também sentem as conseqüências
da crise. Não é apenas a burguesia que está
enfurecida porque caíram os seus lucros, nem as camadas médias
que se ressentem de que as migalhas antes destinadas aos mais pobres
pelo Estado (que na verdade destina as mais gordas fatias do
orçamento aos super ricos através do mecanismo da
dívida pública) supostamente corroeram o seu padrão
de vida (sentimento mesquinho e patético pelo seu grau de
ignorância). Os trabalhadores são os que na verdade
sentem de forma mais pesada os efeitos da crise. Demissões,
arrocho salarial, inflação, endividamento,
intensificação do trabalho, precarização
dos serviços públicos, sucateamento das escolas,
hospitais, transportes, cortes de verbas, etc. Isso dá motivos
de sobra para que os trabalhadores se mobilizem.
As lutas
já vem ocorrendo. As greves aumentaram constantemente desde o
início da década, e também as manifestações
de rua e outras formas de luta. Mas ainda é preciso muito mais
do que isso. É preciso unificar todas essas lutas e a partir
delas apresentar uma alternativa de projeto para os trabalhadores,
contra o governo do PT e a oposição do PSDB. Para se
tornar referência de luta e não se confundir com o
oportunismo e o peleguismo do PT, a esquerda precisa retomar os
métodos radicalizados: ocupação de fábricas
e empresas que ameaçarem, demitirem ou fecharem, bloqueio de
ruas e avenidas, ocupação de prédios públicos,
piquetes radicalizados. Para massificar o apoio às propostas
da esquerda, é preciso construir um movimento de organização
nos locais de trabalho contra os abusos dos chefes e patrões,
e não apenas meras chapas de oposição como tem
feito o movimento sindical. É preciso relançar na
sociedade o debate sobre um projeto anticapitalista e socialista. A
esquerda precisa sair da sua condição de coadjuvante e
das suas disputas internas mesquinhas para ser capaz de enfrentar a
ofensiva da oposição ao PT e se desvencilhar da
armadilha do próprio PT.
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