29.11.16

Agressão na escola do MST: como chegamos a esse ponto?



Como foi que chegamos a esse ponto? Policiais entram atirando na escola do MST. Policiais retiram estudantes que ocupavam o Centro Paula Souza, sem mandado judicial. Violência nua e crua, brutal, irracional, animalesca, grotesca e debilóide, mas ainda assim friamente calculada pelos seus sórdidos orquestradores. Abuso de poder, arbitrariedade e ações ilegais das “autoridades” se multiplicam. Corruptos e corruptores são espetaculosamente presos, processados, delatados, liberados, alguns sim, outros não, condenados e absolvidos no tribunal da “opinião pública”, ao sabor das conveniências e obediências do momento. A fachada do Estado democrático de direito cai por terra.
O atrevimento não tem limites. Gastos com a saúde e a educação pública congelados por 20 anos. Aposentadoria somente aos 65 anos, e igual para homens e mulheres. Negociação podendo prevalecer sobre a CLT e retirar direitos que nos custaram um século de lutas para serem conquistados. Enquanto isso, no andar de cima, bilhões de dólares remetidos ilegalmente ao exterior agora repatriados sem pagar imposto. Banquetes nababescos para celebrar o corte nos já precários investimentos que garantem a sobrevida de serviços públicos sucateados.
O cinismo e a desfaçatez dominam impunes os meios de comunicação, que repetem o refrão de que não há alternativa a não ser passar a conta da crise para os explorados, os oprimidos e miseráveis. O ódio corre solto contra as vítimas da opressão que ousam se levantar. A crueldade dos privilegiados não tem mais pudor nenhum em exibir seu desprezo arrogante e agressivo contra a massa sofredora.
Como foi que chegamos a esse ponto? Como foi que deixamos essa situação se estabelecer sem sermos capazes de reagir? Onde estão as organizações da nossa classe? Onde estão os sindicatos, as federações, as centrais sindicais? Por quê não mobilizam suas bases? Onde estão as reuniões nos locais de trabalho, as plenárias, as assembleias, as greves, os piquetes? Onde estão os trabalhadores? Onde estão os metalúrgicos, os petroleiros, os químicos, os bancários, os professores? Onde estão as empregadas domésticas, os motoboys, os vigilantes, os frentistas, as balconistas?
Os trabalhadores são a esmagadora maioria da sociedade, são os 99%. Por quê estão imóveis no chão de fábrica, na sala de aula, no guichê do caixa, no assento do motorista? Por quê não se dialoga sobre suas verdadeiras demandas? Por quê as organizações da classe lhes viraram as costas? Por quê não há quem ponha o pé no barro e vá dialogar com eles e elas? Por quê se permitiu que a crença nas saídas individuais, no empreendedorismo, na “meritocracia”, substituísse a confiança nas saídas coletivas? Como os trabalhadores podem estar imóveis, assistindo os arautos do ódio na TV, nas igrejas, nos jornais, na internet, nos celulares?
Por quê os trabalhadores não se movem? Por quê não há lutas? Por quê as ruas não estão cheias? Por quê não há reuniões, comícios, atos panfletagens? Por quê se ocupam escolas, mas não as fábricas? Por quê se enchem algumas praças, mas não se bloqueiam as estradas e avenidas? Por quê se fazem falas em algumas universidades, mas não nos bairros e comunidades? Por quê se fazem alguns discursos, mas não se diz o necessário?
Como foi que chegamos a esse ponto? Por quê não se falam mais as verdades essenciais? Em que lugar do caminho esquecemos os traços mais elementares do mundo em que vivemos? Por que deixamos de falar em luta de classes? Por quê deixamos de falar em capitalismo? Em mais valia? Em alienação? Em que lugar esquecemos que o Estado não é um espaço neutro em disputa, o Estado e todas as suas instituições são o inimigo? Como se instalou a ilusão de que o capital pode ser administrado ou “humanizado” ao invés de destruído pela força da classe trabalhadora organizada e consciente? Por que deixamos de nos preparar para a luta como ela deve ser feita, desde os locais de trabalho, estudo e moradia, e não nas cúpulas dos palácios, entidades e aparelhos? Por que deixamos de falar em revolução e emancipação?
Alguns (parte de boa fé, mas muitos de má fé) acharam que era possível contornar essas verdades essenciais, distribuindo migalhas em cartões eletrônicos (débito ou crédito, conforme se tratasse das “classes” C, D ou E). Agora, todos pagam o preço desse trágico engano.
Quanto sangue e quantas lágrimas ainda serão derramadas até que voltemos a falar com os trabalhadores sobre as verdades essenciais?