28.12.11

As campanhas salariais do 2º semestre (2011) e o obstáculo das direções governistas


O discurso de que tudo vai bem no país

Está em curso um operativo político-ideológico que visa convencer o conjunto da população de que o país está no rumo certo para o “crescimento”, e de que a classe trabalhadora deve continuar “fazendo a sua parte”, o que na verdade significa que os trabalhadores devem continuar suportando o aumento da exploração em benefício da burguesia. Esse convencimento permite ao governo Dilma/PT/PMDB seguir aplicando o projeto de interesse da burguesia, mantendo a classe trabalhadora sob controle. Parte essencial desse operativo politico-ideológico são os próprios organismos de luta da classe trabalhadora.

Os principais sindicatos e centrais do país, que representam as principais categorias, estão sob controle de um grupo politico, a Articulação, grupo hegemônico do PT e da CUT, que juntamente com outras correntes (CTB, Força Sindical, UGT, etc.), tem como objetivo impedir o desenvolvimento de lutas que questionem a aplicação do projeto do governo. No segundo semestre de todo ano acontecem as datas-bases de importantes categorias, tais como metalúrgicos, petroleiros, químicos, bancários, funcionários dos correios, que atuam em setores-chaves da economia. As campanhas salariais dessas categorias, se fossem bem organizadas, teriam o poder de paralisar a economia e colocar em xeque a aplicação do projeto do governo, forçando a patronal a fazer concessões. Justamente por isso, as direções sindicais cutistas/governistas trabalharam de todas as formas para desorganizar as campanhas e impedir o seu desenvolvimento.

Os métodos para enfraquecer as greves

O enfraquecimento das campanhas salariais começa pela separação entre as diversas categorias, ou seja, por um calendário em que as datas para deflagração das greves não coincidem. Greves conjuntas poderiam resultar em piquetes conjuntos, assembleias conjuntas, atos e passeatas unificadas, ações de grande impacto junto à sociedade, em que as reivindicações dos grevistas se contrapusessem ao discurso de que “o país está no caminho certo". Para evitar isso, as datas de assembleias e greves são escalonadas pela burocracia, para que não coincidam. Apenas bancários e correios estiveram em greve simultaneamente por alguns dias.

O segundo dispositivo consiste em, no interior de cada categoria, despolitizar a campanha, tirando o foco das questões políticas de fundo. Em correios, por exemplo, a greve foi marcada para meados de setembro, depois da votação da MP 532 no início do mês, que criara o marco legal para a transformação da Empresa de Correios e Telégrafos em SA e para a privatização. Com isso, impediu-se que a greve tivesse um conteúdo de luta contra a privatização.

O terceiro passo consiste em rebaixar as reivindicações. Quem começa pedindo pouco acaba fechando por menos ainda. Assim, em bancários, por exemplo, as perdas salariais acumuladas desde o plano real em 1994 estão em 89% no Banco do Brasil e 98% na Caixa Econômica. Mas a Articulação começou a campanha reivindicando apenas 12,5% e fechou acordo com míseros 9%! E ainda sai propagandeando “ganho real” acima da inflação (o índice oficial de inflação maquiado pelos institutos governistas foi de 7,5%).

O quarto componente do método da burocracia se refere à própria condução da campanha, à falta de espaços democráticos. O comando de negociação é composto apenas por dirigentes sindicais, afastados dos locais de trabalho, fechados com a linha da Articulação, sem participação de representantes de base.

A ditadura do microfone

Nas assembleias dirigidas pela Articulação e seus satélites vigora a ditadura do microfone, em que apenas a diretoria fala e os trabalhadores comparecem apenas para votar a favor ou contra. Não são abertas inscrições, não se permite fazer propostas, não se colocam as propostas em votação. E o cúmulo do desrespeito acontece quando as propostas apresentadas pelas oposições (depois de muita luta pelo direito básico de falar) ganham uma votação, mas não são encaminhadas pela diretoria.

Na greve dos bancários, em São Paulo, na assembleia de 05 de outubro, foram aprovadas várias propostas organizativas defendidas pelas oposições (assembleias unificadas, no horário das 16:00, para barrar os fura-greves), mas a mesa não aceitou o resultado e encerrou a assembleia, num brutal atentado contra a democracia operária! Vídeos e textos sobre essa assembleia se encontram disponíveis na internet (http://frentedeoposicaobancaria.org/noticias/a-assembleia-de-510-em-sp-e-a-luta-por-democracia/). Novas assembleias só aconteceram 12 dias depois, no dia 17, para esvaziar o processo de auto-organização dos trabalhadores que estava ocorrendo nas plenárias espontâneas após as assembleias. Além disso, as assembleias do dia 17 foram marcadas desrespeitando ostensivamente os encaminhamentos organizativos aprovados no dia 5. Em assembleias separadas de BB, CEF e privados, depois das 18:00hs, com a presença massiva de gerentes e fura-greves, a Articulação conseguiu aprovar o acordo rebaixado e encerrar a campanha, pois jamais conseguiria aprovar esse acordo com o voto dos grevistas.

O cerco da mídia e do Estado

Outro elemento importante do operativo de combate às greves é a participação da mídia. Os meios de comunicação em geral jogam a população contra os grevistas e atuam em sintonia com as direções governistas para sabotar o movimento. Na greve dos Correios as rádios e os jornais da manhã do dia 4 de outubro davam como encerrada a greve, pois “os trabalhadores” haviam aceito o acordo negociado com a mediação do TST no dia anterior. Acontece que os dirigentes sindicais não falavam em nome dos trabalhadores, pois nas assembleias do dia 4 os ecetistas recusaram a proposta e prolongaram a greve, que continuou até a semana seguinte.

Quando todos esses elementos falham, a patronal, o governo e a burocracia sindical podem contar com a repressão pura e simples. Para encerrar a greve dos Correios, o TST determinou os termos do acordo e impôs o desconto e a compensação de parte dos dias parados. Os ministros do TST ainda passaram um “pito” nos dirigentes sindicais, que não haviam tido a competência de fazer seu trabalho, ou seja, encerrar a greve na semana anterior.

As limitações das oposições e a alternativa

Contra todas essas armas da burocracia da Articulação e seus satélites, a postura das correntes que se reivindicam como oposição, como Conlutas e Intersindical, se mostrou bastante insuficiente. A começar pela questão ideológica, o eixo escolhido pela Conlutas, "O Brasil cresceu, o trabalhador quer o seu”, não serviu para armar os trabalhadores. Essa formulação tem vários problemas: reduz ao economicismo, como se o objetivo das campanhas fosse apenas aumento de salario; vincula a remuneração do trabalhador ao desempenho das empresas, pois condiciona a parte do trabalhador ao crescimento do lucro, legitimando assim o aumento da exploração; endossa o discurso do governo Dilma de que o país está no rumo do crescimento, sem questionar a custa de quê esse crescimento esta sendo obtido; não arma para os períodos de crise, em que não vai haver crescimento. Além disso, os militantes da Conlutas aceitam acordos com as direções cutistas e seus satélites que lhes permitem usar o microfone nas assembleias, mas desde que não usem para questionar todo o caráter burocrático e cupulista das assembleias e da campanha.

Para que os trabalhadores possam ter o controle de suas lutas nas campanhas futuras, não há outro caminho a não ser desenvolver um forte trabalho de base, com organização a partir dos locais de trabalho para as lutas cotidianas. Somente assim os trabalhadores podem chegar com força ao momento das campanhas salariais e enfrentar o controle das burocracias governistas. É preciso ainda desenvolver a consciência de que as lutas devem ser travadas não por categorias isoladas, mas pelo conjunto da classe, e não apenas contra uma ou outra empresa ou setor da economia ou do Estado, mas contra todo o sistema capitalista.

Daniel Menezes Delfino
04/11/2011

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