Ele conseguiu. George W. Bush conseguiu. O glorioso líder do Mundo Livre obteve enfim a tão sonhada vitória. Ele capturou Saddam Hussein. Esse é finalmente o seu tão esperado momento de glória. A tardia redenção de um mandato marcado pelos fracassos, ultrajes e vexames. George W. Bush merece os parabéns. O novo César se imagina glorioso numa quadriga romana, com Saddam atado pelos punhos, arrastado pelo galope dos seus corcéis, desfilando pela Pensilvânia Street, a rua da Casa Branca, colhendo palmas e louros de uma plebe maravilhada.
Depois de enfrentar o repúdio da opinião pública mundial; de humilhar e ofender aliados geopolíticos históricos; de jogar na lata do lixo nada menos que a ONU; de mover uma guerra sob o pretexto escandalosamente fraudulento das armas de destruição em massa iraquianas; de tornar-se o alvo predileto de críticas e chacotas mundo afora; de passar o vexame de uma guerra que faz mais baixas depois de oficialmente encerrada; de expor a hipocrisia do imperialismo estadunidense por meio de licitações viciadas para beneficiar os amigos do rei na reconstrução da colônia; portando-se em todos esses momentos com uma desfaçatez, uma parvoíce, uma vulgaridade e um acinte dos quais nenhum líder burguês até hoje havia sido capaz; George W. Bush chega ao apogeu de seu mandato.
Sua persistência encontrou um prêmio à altura: um espantalho humano no auge de sua abjeção, um ditador de quinta categoria reduzido aos trapos, um zumbi pronto para servir de Judas na comédia de mau gosto de seu julgamento. Eis o merecido prêmio para tamanha tenacidade. Cada vencedor tem os troféus que merece. A conquista do Iraque... que grande vitória... É isso que George W. Bush imagina ser o grande êxito de seu governo? Completar uma guerra oportunista e interesseira mal terminada por seu pai? É assim que ele imagina estar assegurando a hegemonia estadunidense? É esse o exemplo de democracia a ser vendido para o resto do mundo?
Quando se esperava dos Estados Unidos uma imagem de grandeza, uma liderança construtiva, uma demonstração das virtudes do capitalismo (?), um modelo societário capaz de substituir globalmente o socialismo diante de seu “fracasso”, temos, ao contrário, uma guerra estúpida e forjada para reaquecer uma economia combalida. Quando se esperava que, diante das lições de 11/09/2003, emergisse uma visão humanista, universalista, que erradicasse o ódio mitigando a pobreza, temos, ao contrário, o massacre dos pobres para “proteger” os ricos.
Que suprema falta de imaginação! Que clamorosa falta de grandeza. Jamais na história um líder tão vil, com um imaginário tão rasteiro, sob pretextos tão ridículos, obteve tamanho poder, sob uma dormência tão vergonhosa de seus compatriotas e um espanto tão grande do resto do mundo. Perto de George W. Bush, pode-se dizer que Napoleão III, o palhaço e saco de pancadas de estimação de Marx, era um estadista. Não há limites para a baixeza a que pode chegar a História, quando esta se repete. George W. Bush é a farsa da farsa. Podemos imaginá-lo saltitando como um retardado, um Alfred Newman da Mad, chupando o dedo, dizendo: “papai, papai, eu consegui!”.
Não se pode nunca subestimar a capacidade humana de conviver com o insuportável. A trajetória de George W. Bush ilustra tristemente essa verdade. Como personagem escatológico, o presidente estadunidense é sucesso garantido. O gosto atual se rende facilmente ao ridículo. O perigo que ele representa se torna desprezível diante do imperativo da audiência. Ninguém se atreve a criticar Bush, sob pena de perder os favores de sua presença e de sua palavra.
Duvidar do governo estadunidense é impensável. Questionar a veracidade de suas informações, mais do que isso, é proibido. No cenário atual, quem pode ter 100% de certeza de que o homem capturado pelas tropas estadunidenses de fato é Saddam Hussein? Quem pode assegurar que não se trata de um sósia? A técnica é conhecida há séculos. Os japoneses usavam os “kagemusha” para personificar figuras ilustres que precisavam desaparecer. Quem tem a autoridade e a credibilidade para certificar que se trata do verdadeiro Saddam?
Não há que se alegar sequer uma vaga utilidade prática na captura. Dois dias depois, um novo atentado terrorista matou 17 pessoas em Bagdá. A prisão de Saddam não mudou em nada o quadro da claudicante “normalização” da situação do Iraque.
Nesse mundo ensandecido, a verdade dos fatos é secundária. O que interessa é a versão. Para todos os efeitos práticos, Saddam foi de fato capturado. Essa é a versão que está valendo. É em cima dela que se trabalha. A mídia não ousa ir além disso. Ninguém ousa investigar, questionar, duvidar. Investigar pode ser perigoso. É possível que acabe se esbarrando numa verdade, o que é hoje inaceitável. Fiquemos pois com o circo medíocre da captura de Saddam. Embora esse incidente seja capital, é apenas o ponto culminante de um longo processo de empulhação da opinião pública.
A mídia de massas burguesa internacional veicula com vexatória subserviência os chavões dos marqueteiros de Bush. “Guerra contra o terrorismo”, “Eixo do Mal”, “libertação” do Iraque, expressões forjadas de molde a fazer crer na necessidade e virtude intrínsecas da invasão e conquista de um país. Expressões que camuflam o interesse econômico e geoestratégico de uma conquista neocolonial em pleno século XXI. Criminosamente, fazem esse absurdo passar como aceitável diante da opinião pública mundial.
O mais trágico disso tudo é que uma visão tão torpe da realidade encontre um eco capaz de lhe dar consistência. Há quem acredite no que esse homem diz. Haverá quem veja no presidente estadunidense um vencedor. A decadência nos valores e idéias não é apenas de Bush, é de todo o povo e de toda a época que ele representa. Um presidente estadunidense, a despeito de todo seu poder, é ainda um produto de seu meio. É alguém que sabe jogar conforme as regras do jogo, do circo em que se transformou a política eleitoral. Nessa visão pervertida da política e da história, o retardado marcou seus pontos.
Para além de todo o ridículo e de todo o absurdo, George W. Bush conseguiu um troféu eleitoral de peso para sua campanha à reeleição em 2004 (vade retro). Com Schwarzenegger no palanque (quiçá trazendo Saddam pela coleira) e o “triunfo” no Iraque, Bush esfrega as mãos antevendo uma fácil vitória no circo eleitoral.
Enquanto isso, nas montanhas do Afeganistão, ninguém mais fala em Osama Bin Laden. O mentor dos atentados de 11/09 permanece foragido. A fantasmagórica encarnação do Eixo do Mal; que é ao mesmo tempo o autor do movimento geopolítico que catapultou George Bush à ofensiva mundial contra o terror. Ele continua à solta, o ex-agente da CIA. Membro de uma família de sócios sauditas da família Bush, o homem certo na hora certa. Talvez não seja mesmo bom mexer com Osama...
Daniel M. Delfino
16/12/2003
Depois de enfrentar o repúdio da opinião pública mundial; de humilhar e ofender aliados geopolíticos históricos; de jogar na lata do lixo nada menos que a ONU; de mover uma guerra sob o pretexto escandalosamente fraudulento das armas de destruição em massa iraquianas; de tornar-se o alvo predileto de críticas e chacotas mundo afora; de passar o vexame de uma guerra que faz mais baixas depois de oficialmente encerrada; de expor a hipocrisia do imperialismo estadunidense por meio de licitações viciadas para beneficiar os amigos do rei na reconstrução da colônia; portando-se em todos esses momentos com uma desfaçatez, uma parvoíce, uma vulgaridade e um acinte dos quais nenhum líder burguês até hoje havia sido capaz; George W. Bush chega ao apogeu de seu mandato.
Sua persistência encontrou um prêmio à altura: um espantalho humano no auge de sua abjeção, um ditador de quinta categoria reduzido aos trapos, um zumbi pronto para servir de Judas na comédia de mau gosto de seu julgamento. Eis o merecido prêmio para tamanha tenacidade. Cada vencedor tem os troféus que merece. A conquista do Iraque... que grande vitória... É isso que George W. Bush imagina ser o grande êxito de seu governo? Completar uma guerra oportunista e interesseira mal terminada por seu pai? É assim que ele imagina estar assegurando a hegemonia estadunidense? É esse o exemplo de democracia a ser vendido para o resto do mundo?
Quando se esperava dos Estados Unidos uma imagem de grandeza, uma liderança construtiva, uma demonstração das virtudes do capitalismo (?), um modelo societário capaz de substituir globalmente o socialismo diante de seu “fracasso”, temos, ao contrário, uma guerra estúpida e forjada para reaquecer uma economia combalida. Quando se esperava que, diante das lições de 11/09/2003, emergisse uma visão humanista, universalista, que erradicasse o ódio mitigando a pobreza, temos, ao contrário, o massacre dos pobres para “proteger” os ricos.
Que suprema falta de imaginação! Que clamorosa falta de grandeza. Jamais na história um líder tão vil, com um imaginário tão rasteiro, sob pretextos tão ridículos, obteve tamanho poder, sob uma dormência tão vergonhosa de seus compatriotas e um espanto tão grande do resto do mundo. Perto de George W. Bush, pode-se dizer que Napoleão III, o palhaço e saco de pancadas de estimação de Marx, era um estadista. Não há limites para a baixeza a que pode chegar a História, quando esta se repete. George W. Bush é a farsa da farsa. Podemos imaginá-lo saltitando como um retardado, um Alfred Newman da Mad, chupando o dedo, dizendo: “papai, papai, eu consegui!”.
Não se pode nunca subestimar a capacidade humana de conviver com o insuportável. A trajetória de George W. Bush ilustra tristemente essa verdade. Como personagem escatológico, o presidente estadunidense é sucesso garantido. O gosto atual se rende facilmente ao ridículo. O perigo que ele representa se torna desprezível diante do imperativo da audiência. Ninguém se atreve a criticar Bush, sob pena de perder os favores de sua presença e de sua palavra.
Duvidar do governo estadunidense é impensável. Questionar a veracidade de suas informações, mais do que isso, é proibido. No cenário atual, quem pode ter 100% de certeza de que o homem capturado pelas tropas estadunidenses de fato é Saddam Hussein? Quem pode assegurar que não se trata de um sósia? A técnica é conhecida há séculos. Os japoneses usavam os “kagemusha” para personificar figuras ilustres que precisavam desaparecer. Quem tem a autoridade e a credibilidade para certificar que se trata do verdadeiro Saddam?
Não há que se alegar sequer uma vaga utilidade prática na captura. Dois dias depois, um novo atentado terrorista matou 17 pessoas em Bagdá. A prisão de Saddam não mudou em nada o quadro da claudicante “normalização” da situação do Iraque.
Nesse mundo ensandecido, a verdade dos fatos é secundária. O que interessa é a versão. Para todos os efeitos práticos, Saddam foi de fato capturado. Essa é a versão que está valendo. É em cima dela que se trabalha. A mídia não ousa ir além disso. Ninguém ousa investigar, questionar, duvidar. Investigar pode ser perigoso. É possível que acabe se esbarrando numa verdade, o que é hoje inaceitável. Fiquemos pois com o circo medíocre da captura de Saddam. Embora esse incidente seja capital, é apenas o ponto culminante de um longo processo de empulhação da opinião pública.
A mídia de massas burguesa internacional veicula com vexatória subserviência os chavões dos marqueteiros de Bush. “Guerra contra o terrorismo”, “Eixo do Mal”, “libertação” do Iraque, expressões forjadas de molde a fazer crer na necessidade e virtude intrínsecas da invasão e conquista de um país. Expressões que camuflam o interesse econômico e geoestratégico de uma conquista neocolonial em pleno século XXI. Criminosamente, fazem esse absurdo passar como aceitável diante da opinião pública mundial.
O mais trágico disso tudo é que uma visão tão torpe da realidade encontre um eco capaz de lhe dar consistência. Há quem acredite no que esse homem diz. Haverá quem veja no presidente estadunidense um vencedor. A decadência nos valores e idéias não é apenas de Bush, é de todo o povo e de toda a época que ele representa. Um presidente estadunidense, a despeito de todo seu poder, é ainda um produto de seu meio. É alguém que sabe jogar conforme as regras do jogo, do circo em que se transformou a política eleitoral. Nessa visão pervertida da política e da história, o retardado marcou seus pontos.
Para além de todo o ridículo e de todo o absurdo, George W. Bush conseguiu um troféu eleitoral de peso para sua campanha à reeleição em 2004 (vade retro). Com Schwarzenegger no palanque (quiçá trazendo Saddam pela coleira) e o “triunfo” no Iraque, Bush esfrega as mãos antevendo uma fácil vitória no circo eleitoral.
Enquanto isso, nas montanhas do Afeganistão, ninguém mais fala em Osama Bin Laden. O mentor dos atentados de 11/09 permanece foragido. A fantasmagórica encarnação do Eixo do Mal; que é ao mesmo tempo o autor do movimento geopolítico que catapultou George Bush à ofensiva mundial contra o terror. Ele continua à solta, o ex-agente da CIA. Membro de uma família de sócios sauditas da família Bush, o homem certo na hora certa. Talvez não seja mesmo bom mexer com Osama...
Daniel M. Delfino
16/12/2003
Nenhum comentário:
Postar um comentário