30.4.07

O Oscar 2003 e o espírito do tempo




“Chicago” é o filme certo no momento certo. Um musical farsesco que escancara a farsa da geopolítica atual. O filme mais duplipensado dos últimos tempos. Em “Chicago” verdade é mentira, culpa é inocência, fama é infâmia, tragédia é glória, lealdade é interesse, e vice-versa, em todos os casos. Nesses tempos orwellianos, a mais gritante contradição deve ser apresentada como versão oficial dos fatos perante a opinião pública. O espetáculo deve continuar a qualquer preço. O cinema em geral oferece um perfeito espelho da sociedade estadunidense. O filme “Chicago” em particular oferece alguns reflexos bastante peculiares, razão pela qual merecidamente foi premiado. Por mostrar que versões são mais importantes que os fatos, as aparências do que a essência, os interesses do que a ética. É claro que os acadêmicos lhe concederam a estatueta sem conceber que nesse espelho está revelada a estratégia da atual política estadunidense o mundo.

Antes de chegar a essa conclusão, falemos um pouco mais do filme e da cerimônia do Oscar como um todo. Tradicionalmente, festas do Oscar são maçantes, cafonas, piegas, e a de 2003 não fugiu à regra. Discursos e homenagens em tons edificantes, música melosa e triunfal, figurinos de gosto duvidoso, sorrisos forçados e piadas sem-graça. Nada disso faltou. Mas a festa desse ano teve um ingrediente a mais, que foi a política. Na maioria das vezes, a política não produz um bom espetáculo e nesse caso serviu apenas para criar um clima de constrangimento e desconforto. Entre os que gostam apenas de cinema, a mistura com a política trouxe um gosto amargo. Para os que se interessam por política e também por cinema, como é o caso desse resenhista, porém, o Oscar 2003 foi um prato cheio.

Como sempre, os principais filmes concorrentes são todos excelentes. É de se pensar que não faz sentido colocar um para concorrer contra o outro. Cada filme se destaca por uma série de motivos especiais e diferentes, que os tornam merecedores. Em cada um há um aspecto que se destaca, que não necessariamente cabe nas tradicionais categorias da competição, portanto não tem como ser premiado. Por causa disso os festivais europeus têm variados prêmios do júri, da crítica, do público, variadas menções honrosas para destacar o que de melhor se fez no cinema. Essa fórmula é mais justa que a do Oscar, pois não é justo que um seja considerado vencedor e os outros perdedores, condenados ao esquecimento. Não é justo, mas esse é o espírito da festa e da cultura estadunidense em geral.

Todos aceitam as regras e comparecem, trajados a rigor. Há artistas que fizeram o trabalho de suas vidas e esperam a oportunidade de entrarem para a história com uma estatueta. Há artistas já consagrados que dão o selo de relevância cultural para a competição. Há os oportunistas de plantão que faturam prêmios na base de inflacionadas campanhas de marketing. Há os prêmios de conveniência, em que a Academia tenta compensar injustiças passadas e fazer média com certas correntes de opinião do público e da crítica. E como conseqüência destes, há os injustiçados deste ano, que viram suas performances serem desprezadas em nome das insondáveis razões dos acadêmicos.

Independentemente desses aspectos, o Oscar 2003 teve atrativos à parte. Destaque para os que se manifestaram contra a guerra que Bush iniciava no Iraque. Nomes como Michael Moore, Adrien Brody, Chris Cooper, Colin Farrel, Susan Sarandon, Pedro Almodóvar, Gael Garcia Bernal, Salma Hayek. Nomes que crescem em prestígio e ascendência moral, que não tem medo de enfrentar a caça as bruxas que virá e que mostram que o cinema pode entrar em sintonia com as boas causas.

Falaremos a seguir de alguns desses destaques, começando por Michael Moore. O vencedor do prêmio de melhor documentário roubou a cena na grande festa da indústria do entretenimento. Aquele que melhor entende de não-ficção denuncia o quanto existe de ficção na realidade. A ficção de uma eleição fraudulenta e de uma guerra fictícia, nas palavras fortes do próprio Moore. E Michael Moore, é bom lembrar, não foi premiado por conveniência. Seu documentário, “Bowlling for Columbine”, sobre um massacre de estudantes por seus colegas de classe, retratou de maneira magistral as raízes da tragédia de uma país movido a paranóia, desconfiança, competição, violência.

Também merece destaque o prêmio para Pedro Almodóvar, pelo roteiro de “Fale com ela”. Esse foi um daqueles prêmios classificados acima como “de conveniência”. Pedro Almodóvar não pôde concorrer na categoria de filme estrangeiro porque as indicações prévias, a partir das quais a Academia seleciona os concorrentes, são feitas pelos governos de cada país. E o governo espanhol, capitaneado por Aznar (que concorre com Blair e Berlusconi ao prêmio “framboesa de ouro” de pior coadjuvante na tragicomédia do Iraque), não indicou “Fale com ela”. Sabe-se lá por quais motivos, Almodóvar tornou-se “persona non grata” para as autoridades culturais de seu país. Sendo assim, a Academia não teve outro remédio a não ser indicar Almodóvar nas categorias principais. Uma espécie de jeitinho estadunidense. E sinal de que o Oscar pode achar brechas para fazer o que os festivais europeus fazem e reconhecer o que deve ser reconhecido.

Também consideramos importante o crescimento do cinema latino nos Estados Unidos. As indicações e prêmios concedidos a “Frida” são um exemplo da crescente influência cultural das comunidades de origem hispânica nos EUA. Os latinos estão tomando de volta território o que os EUA roubaram do México no século XIX. Esperamos que tragam mais diversidade e colorido a uma cultura e uma sociedade dominadas pelo moralismo ingênuo e hipócrita dos puritanos. Méritos para Salma Hayek, pelo empenho para realizar “Frida” e encarnar o papel.
E pela coragem de levar ao mundo a história de uma pintora e ativista, amante dos comunistas Diego Rivera e Leon Trotsky. Méritos também para os maquiadores que conseguiram transformar a musa Salma Hayek na figura de Frida Kahlo, trabalho que não é nada fácil. O filme é também um sinal de uma certa globalização do Oscar, como as indicações de “O Tigre e o Dragão” para as categorias principais há alguns anos, um filme falado em chinês.

Consideramos também um destaque negativo as não-indicações de Andy Sirkis e Weta a melhor coadjuvante com o personagem Gollum e de Peter Jackson a melhor diretor, por “As duas Torres”, segunda parte da trilogia “O Senhor dos anéis”. Aqui vai uma certa dose de preferência pessoal, mas é inegável que a Academia perdeu a chance de fazer história indicando um personagem virtual e de reconhecer o talento de um diretor responsável por um empreendimento cinematográfico ímpar. Melhor sorte para ambos no ano que vem, com “O Retorno do Rei”.

É certo que fizerem uma média indicando “As duas Torres” como melhor filme, mas isso só fez completar uma outra injustiça. Pois o segundo filme da trilogia não tinha chances na categoria principal e apenas roubou o lugar de “Estrada para Perdição”, inexplicavelmente excluído da disputa de melhor filme. Talvez apenas por ter sido lançado no momento errado, fora da “temporada” do Oscar. O que mostra o quanto as questões comerciais superam as artísticas em Hollywood.

Por falar em injustiças, que dizer de “Gangues de Nova York”, em que Scorcese e Daniel Day-Lewis saíram de mãos abanando? Esses dois foram casos de artistas que fizeram um dos melhores trabalhos de suas vidas e que por contingências do momento não foram reconhecidos (vide crítica a “Gangues de Nova York”, intitulada “Os bons comunistas”, a ser em breve aqui publicada).

Voltando a falar de destaques positivos, merecem menção os prêmios para o filme “O Pianista”, o de Roman Polanski como diretor e o de Adrien Brody para melhor ator. Há quem fale na força do lobby judaico em Hollywood. Numa indústria administrada por judeus, qualquer filme sobre a II Guerra tem boas chances de sair da festa com algumas estatuetas. Hollywood elegeu o holocausto ao nível de tragédia mundial por excelência e transformou os judeus em vítimas perpétuas. O que propicia uma boa cobertura à política estadunidense de apoio incondicional a Israel e a genocidas como Sharon.

A condição dos judeus de vítimas do holocausto dá a Israel uma imunidade a críticas dentro dos E.U.A., de um modo tal que qualquer crítica às sua políticas de holocausto contra os palestinos imediatamente são tomadas como ataques nazistas. O público estadunidense aprendeu no cinema que os judeus são vítimas e assim será para sempre, mesmo que eles hoje façam vítimas dos palestinos. Nada irá mudar essa imagem, ainda mais agora, depois do 11 de setembro, quando os estadunidenses passaram a se sentir irmãos dos israelenses, ameaçados pelo terrorismo palestino. A semelhança está indissociavelmente colada.

Vivemos um momento de palestinização do mundo. A cada chacina perpetrada pelos “bulldozers” de Sharon na Palestina, seguem-se atentados de homens-bomba em Israel. Do mesmo modo, a cada ataque preventivo da guerra de Bush contra o eixo do mal seguir-se-ão ondas de hostilidade irracional aos Estados Unidos, que apesar de justificadas, serão completadas por mais ataques terroristas, que ameaçam mergulhar o mundo numa escalada de vinganças que se auto-alimentam, obscurecendo a razão e o diálogo.

Fizemos essa digressão para comentar que qualquer filme sobre o holocausto judeu, portanto, é sempre bem vindo para a Hollywood sionista. Mas o caso de “O Pianista” me parece bem diferente. É claro que se trata de um filme sobre o holocausto judeu. Mas é também um filme sobre a sobrevivência do homem, do humanismo, das artes e das luzes, em meio ao caos. Sempre é válido que um filme nos relembre a importância da II Guerra Mundial. Uma guerra que é a grande tragédia fundadora do mundo do século XX. Todas as instituições e todo discurso das décadas imediatamente seguintes foi montado para impedir a possibilidade de um conflito tão gigantesco quanto esse se repetir.

Aos trancos e barrancos, a ONU, a União Européia e outras instituições fizeram com que um conflito das proporções da Segunda Guerra tenham se tornado inimagináveis no mundo atual. Ninguém hoje consegue conceber as grandes potências se digladiando pelo poder numa guerra aberta, decidida na força bruta de seus arsenais. Certo que a Guerra-Fria serviu como motivação de uma série de guerras bem quentes, especialmente no Terceiro Mundo. Mas o que estamos dizendo é que ninguém poderia conceber que EUA e URSS chegariam às vias de fato, como as potências imperialistas chegaram nas duas guerras mundiais. Ninguém, a não ser os próprios cidadãos estadunidenses, crédulos como sempre nos espantalhos alardeados por seus governos, acreditou na possibilidade de uma guerra entre as potências.

É esse passado bárbaro que parecia estar enterrado com o fim da Segunda Guerra. As guerras hoje em dia são mediadas pela diplomacia, pela mídia e pela opinião pública. Não transcorrem livremente ao gosto dos generais, como gostariam os aspirantes a Hitler de hoje. A humanidade já não aceita a volta de um tal passado. Lembrar a Segunda Guerra mundial e o holocausto judeu tem essa importância maior de lembrar a humanidade de se manter vigilante contra a barbárie. Devemos acrescentar que o holocausto não foi a única tragédia da Segunda Guerra. E o regime nazista não era pior que o imperialismo francês, inglês ou americano, apenas mais desvairado. Mas não se pode negar o mérito de filmes como “A lista de Schindler” e “O Pianista”.

Por isso defendo que o filme de Polanski ultrapassa a mera condição de um filme sobre o holocausto. É um filme sobre a tragédia humana de modo geral. É interessante a escolha de um pianista como protagonista. Wladyslav Szpilman, o pianista do título, sobrevivente como o próprio Polanski, não é um músico judeu típico. O instrumento musical peculiar do judeu é o violino. Um instrumento triste e melancólico, como é o judeu na diáspora européia. O piano é um instrumento mais universal. As cenas em que Szpilman/Brody toca no filme são de uma beleza sublime e transcendente. As notas da música de Chopin vertem cristalinas como uma cascata de lágrimas diretamente da alma de todos os indivíduos e povos oprimidos. Chopin, compositor e ícone romântico do século XIX, é a voz não só dos judeus, mas de todos os povos sem pátria, como era a sua Polônia.

Um último destaque individual vai para Polanski. A mídia bem que gostaria de transformar sua premiação num factóide, pelo fato de que o diretor não pode pisar nos Estados Unidos. Pesa sobre ele uma condenação por estupro por ter mantido relações sexuais com uma adolescente de 13 anos. Não importa que a relação tenha sido consensual, que ela não aparentasse ser menor de idade, e que a acusação tenha sido feita pela mãe da garota e por procuradores à la Kenneth Starr (o da Mônica Lewinski, lembra?), loucos para fazer fama e construir uma carreira prendendo um figurão de Hollywood por seus excessos.

O que importa nesse episódio é que a mídia quer heróis e vilões planos, bidimensionais, sem nuances e contradições. A mídia quer uma imagem chapada, mais vendável para público e chamativa para a audiência. E Roman Polanski é uma figura difícil de enquadrar no dicionário do xerife texano. É um sobrevivente do holocausto, portanto um herói. Mas é um estrangeiro, judeu, intelectualizado, portanto um vilão. Mas é um cineasta, um homem das artes e do espetáculo, portanto um herói. Mas faz filmes que chocam a moral, como “O bebê de Rosemary”, portanto é um vilão. Mas teve sua mulher barbaramente assassinada por um culto satânico, portanto é uma vítima e um herói. Mas teve relações com uma adolescente, portanto é um vilão. Voltou ao exílio e fez filmes de uma certa canastrice, que pareciam tê-lo alijado para sempre dos holofotes. Até voltar com “O Pianista”, que lhe devolve a condição de herói. Ou não?

Procuramos com isso mostrar a necessidade de uma compreensão mais matizada e nuançada dos filmes, da moral e da política. As categorias de “herói” e “vilão”, bom e mal, às vezes são úteis na ficção, mas não servem para descrever a realidade. Há que se considerar as contingências. Não é porque os judeus hoje são carrascos que se pode esquecer que um dia foram vítimas. É preciso dar a cada holocausto o seu devido contexto e lugar na história, nunca mistificar e anular um em nome do outro. Essa postura que só enxerga contrastes crus entre o bem e o mal é mais própria de políticos que fazem suas carreiras perseguindo inimigos fictícios. Falaremos mais adiante sobre políticos farsantes e inimigos fabricados.

E finalmente, por falar em farsas, falemos de “Chicago”, o filme que, como dissemos na introdução, revela o “zeitgeist” em que vivemos, o espírito do tempo. A Academia soube reconhecer o trabalho mais bem afinado com as contradições e peculiaridades da época atual. E é essa afinação que constitui uma verdadeira obra de arte. A Academia foi sábia em sua ignorância. Na apoteose da farsa, ela nos mostra a realidade.

Naturalmente nada disso seria possível se o filme não fosse excelente do ponto de vista artístico. O principal, num filme musical, são, obviamente, as músicas. Em “Moulin Rouge” o expediente foram sucessos românticos da musica “pop”. Em “Chicago” surgiram composições originais que narram a própria história do filme. E são todas músicas de grande apelo, “grudentas”, que aderem à mente com grande facilidade e nos fazem sair da sala de exibição assobiando e contarolando alegremente.

Para sustentar esse repertório, são necessários números de dança exuberantes, bem coreografados, bem executados, em cenários bem montados, com ritmo e edição envolvente. Em “Chicago”, os números musicais acontecem todos na mente de uma das protagonistas, a ingênua e ao mesmo tempo esperta Roxie Hart. (Renée Zellweger). Roxie vive num mundo de fantasia, onde tudo é jazz e dança. Todos os eventos que se narram na história, sua descida ao inferno da prisão, sua transformação em celebridade, seu julgamento e sua consagração final como vedete se transformam, por força de sua imaginação delirante, em números de valdeville, que são todo o conteúdo do filme.

Roxie é o eixo em torno do qual giram a também vedete e também assassina Velma (Caterine Zeta-Jones) e o advogado canastrão Billy Flynn (Richard Gere), além de coadjuvantes interessantes como o marido Amos (John C. Reilly) e Mama Morton (Queen Latifah). Todos compõem personagens simpáticos e carismáticos, com os quais é fácil se identificar e pelos quais se pode torcer com gosto.

A despeito disso, “Chicago” e “Moulin Rouge”, ambos excelentes filmes, não vão ressuscitar um gênero, ao contrário do que se tem afirmado. Assim como “Dança com Lobos” e “Os Imperdoáveis”, também excelentes e premiados, não ressuscitaram o gênero bang-bang, o musical não vai ressurgir das cinzas. São gêneros mortos, que não dizem mais nada à sensibilidade contemporânea. Os exemplos citados são exceções que confirmam a regra. Destacam-se pelo caráter aberrante de terem sido feitos fora de sua época. São como curiosidades, como filmes de época, que vez por outra aparecem, falando de outros momentos, outros mundos, outros valores. Documentos inestimáveis, sem dúvida, entretenimento de qualidade, que o marketing contingente tenta explorar para criar onda e faturar uns dólares.

A moral da história, em “Chicago” é na verdade imoral, pois diz que se pode sair livre de um assassinato. Basta ter charme e talento para inventar a história certa e carisma para carregá-la. Criar um bom espetáculo é a melhor maneira de esconder a verdade e chegar onde se quer. O espetáculo, em “Chicago”, é de altíssima qualidade. Bem diferente do espetáculo da política mundial atualmente.

A escolha de “Chicago” como melhor filme pela Academia de Hollywood é uma inadvertida confissão do caráter farsesco do poder estadunidense. Em certo momento do filme se diz que o julgamento a que estão sujeitas as protagonistas não passa de um circo. Que o mundo é um grande circo. No circo, tudo que importa é o deslumbramento. Atordoar o público com um espetáculo tão exuberante que não lhe dê tempo para pensar. Mágicas, malabarismos, contorcionismos, acrobacias, em ritmo frenético. Um espetáculo atrás do outro, para produzir vertigem e anestesiar a razão.

No circo do mundo, os mágicos estadunidenses produzem truques atrás de truques para atordoar a audiência mundial. Como prestidigitadores de segunda que são, conseguem enganar apenas o seu público interno, que acredita em tudo que diz a televisão. A crer na CNN, o Iraque estaria prestes a bombardear N.Y. com armas de destruição em massa. O sucateado Iraque, enfraquecido por mais de uma década de bloqueio e bombardeios, é apresentado como uma nova versão do Império do Mal. O substituto da União Soviética, que serviu de justificativa para a corrida armamentista dos anos 1980.

O público não-estadunidense sabe o quanto é absurdo um tal discurso e quais os interesses que ele esconde. Sabe da necessidade urgente de revitalizar a economia estadunidense às custas de petróleo barato e verbas bilionárias para a indústria armamentista, cujos executivos ocupam, por “coincidência”, cargos no governo Bush. O filho do presidente, o caso mais mal-sucedido de sucessão familiar de que se tem notícia na história, é o palhaço-mor do circo. O palhaço entretém a audiência enquanto nos bastidores do espetáculo os artífices do sistema tratam de fazer a máquina girar.

A personalização do conflito nas figuras de Bush e Saddam produz um clima de luta do bem contra o mal que esconde os reais interesses envolvidos. O público se ocupa em discutir quem é o pior, o retardado mental ou o tirano grotesco. A mídia quer fazer deles os protagonistas do seu show de horrores. Entre indignada e enojada, a audiência compra o ingresso à força. Manchetes de revista e programas de TV proporcionam uma overdose de imagens de efeito e frases espetaculosas. Tudo sem a menor reflexão e questionamento. Como os mestres do circo querem.

Enquanto o espetáculo de bombardeios e atrocidades continua, os mestres do circo contabilizam seus ganhos no tabuleiro de xadrez global. O império estadunidense, posto na defensiva pelo crescimento do movimento antiglobalização, tornou-se vítima por força de um providencial atentado em 11/09/2001. Justificado pelo atentado, o império declarou guerra ao “eixo do mal” do terrorismo, guerra sem-fim, que se auto-legitima e se autoriza automaticamente a cometer ataques preventivos e estratégicos. O império está na ofensiva. O mundo se levanta em protestos de rua, redescobrindo o pacifismo. O movimento antiglobalização se metamorfoseia em movimento contra a guerra. A guerra e a destruição são essenciais ao sistema do capital, bem o sabem os executivos do governo Bush, digo, os magos.

Magos que sabem como tirar coelhos da cartola. Coelhos não surgem do nada. assim como atentados terroristas. Assim como golpes de estado, que não surgem como raios em dia de céu azul, diria Marx. Para bom entendedor, meia palavra basta. Chegamos assim ao ponto culminante da festa, digo da resenha, o momento de abrir os envelopes.
E o Oscar vai para...

Osama bin Laden!!

Daniel M. Delfino

29/03/2003

P.S. Principais filmes mencionados:

“O Pianista”
Nome original: The pianist
Produção: França, Alemanha, Inglaterra (UK), Polônia
Ano: 2002
Idiomas: Inglês, Alemão, Russo
Diretor: Roman Polanski
Roteiro: Wladyslaw Szpilman, Ronald Harwood
Elenco: Adrien Brody, Thomas Kretschmann, Frank Finlay, Maureen Lipman, Emilia Fox, Ed Stoppard, Julia Rayner, Jessica Kate Meyer, Michal Zebrowski
Gênero: biografia, drama, música, guerra

“Chicago”
Nome original: Chicago
Produção: Estados Unidos, Alemanha
Ano: 2002
Idiomas: Inglês, Húngaro
Diretor: Rob Marshall
Roteiro: Maurine Dallas Watkins, Bob Fosse, Fred Ebb, Bill Condon
Elenco: Catherine Zeta-Jones, Renée Zellweger, Richard Gere, Dominic West, John C. Reilly, Taye Diggs, Cliff Saunders
Gênero: musical, comédia, crime, drama

“Gangues de Nova York”
Nome original: Gangs of New York
Produção: Estados Unidos, Alemanha, Itália, Inglaterra (UK), Holanda
Ano: 2002
Idiomas: Inglês, Irlandês (Gaélico)
Diretor: Martin Scorsese
Roteiro: Jay Cocks
Elenco: Leonardo DiCaprio, Daniel Day-Lewis, Cameron Diaz, Jim Broadbent, John C. Reilly, Henry Thomas, Liam Neeson, Brendan Gleeson, Eddie Marsan, Larry Gilliard Jr.
Gênero: crime, drama, história

“Tiros em Columbine”
Nome original: Bowling for Columbine
Produção: Canadá, Estados Unidos, Alemanha
Ano: 2002
Idiomas: Inglês
Diretor: Michael Moore
Roteiro: Michael Moore
Elenco: Jacobo Arbenz, George Bush, George W. Bush, Charlton Heston, Marilyn Manson, Timothy McVeigh, Michael Moore, Mohammed Mossadegh, Dinh Diem Ngo, Terry Nichols, Manuel Noriega, Shah Mohammed Reza Pahlavi, Augusto Pinochet, Jeff Rossen, Matt Stone
Gênero: documentário

Fonte: “The Internet Movie Database” – http://www.imdb.com/

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