17.4.07

Porque o Brasil ganhou a Copa de 2002




A copa de 2002 foi um produto típico da globalização. A globalização significou de certo modo uma brasilianização do mundo. Não é apenas o Brasil que se globaliza, mas o mundo que se brasilianiza. Todo processo histórico-social é uma via de mão dupla, ou contradição dialética, como diziam os antigos.

O Brasil é o país da desigualdade, da corrupção e do jeitinho. A desigualdade, a corrupção e a malandragem (ou desfaçatez) se tornaram as marcas do mundo globalizado. O planeta como um todo tornou-se uma versão ampliada do Brasil: ilhas de riqueza cercadas por bolsões de miséria. Os dirigentes e as instituições internacionais agora são vistos como corruptos irrecuperáveis e especuladores insaciáveis, atuando com o beneplácito da mídia global deslumbrada.

Dentre estas instituições, a que mais se brasilianizou foi a FIFA, resultado de uma gestão de 24 anos nas mãos do brasileiro João Havelange. Como qualquer político brasileiro, coronelista e corrupto, Havelange distribuiu benesses e favores aos aliados para ser reeleito continuamente, comprando os votos das federações, prática disseminada alhures...

O resultado disso foi uma Copa do Mundo inflada, com 32 participantes, e dividida em dois países. Uma Copa do Mundo realizada na Ásia inevitavelmente se defrontaria com o problema das monções, a estação das chuvas, que coincide com os meses tradicionalmente reservados para a disputa do Mundial. Como é impossível adiar as monções, a alternativa é mudar a data da Copa. Pois é preciso globalizar o futebol a qualquer custo, levando a disputa para a Ásia e agradando os caciques locais.

A Copa do Mundo foi antecipada em quinze dias. Com isso, ficou muito próxima do fim da temporada européia. O intervalo entre o fim das principais ligas nacionais européias e da Copa dos Campeões e o início da Copa do Mundo ficou muito pequeno, insuficiente para que os jogadores pudessem se recuperar fisicamente do desgaste. Jogadores como Figo e Zidane chegaram à Copa “bichados”. Em cada seleção do Mundial havia pelo menos um jogador “estourado”, que foi para a disputa cercado de dúvidas sobre suas reais condições físicas. Inclusive no Brasil, como era o caso de Ronaldo e Rivaldo.

Nestas condições, entretanto, o Brasil jogou em casa. Nossos jogadores tem o know-how da improvisação, aprendido na pátria-mãe. Aqui os times são montados às pressas, os jogadores se entrosam no decorrer do campeonato, os esquemas são improvisados, a preparação é “meia-boca”, os técnicos são chamados no meio da competição como salvadores da pátria (caso de Felipão na Seleção). O “empurrar com a barriga” faz parte do caráter do povo brasileiro, não só no futebol. É a receita da sobrevivência num país de soluções provisórias e carências perpétuas. Nosso futebol espelha a precariedade de nossa civilização. O que é o drible senão a habilidade de quem muito apanha de escapar da pancada?

Ora, uma Copa tão desorganizada quanto os campeonatos brasileiros (vide o problema da venda de ingressos) só poderia ser ganha pela seleção brasileira. O estilo brasileiro passou a predominar também fora de campo, o que é extremamente negativo. Ao invés de nos melhorarmos, pioramos os outros! Mas como os jogadores e técnicos brasileiros estão acostumados com esse estilo de seus dirigentes, saíram com vantagem na disputa! Times que fizeram tudo certo em sua preparação, como Argentina e França, fracassaram miseravelmente; o Brasil, que fez tudo errado, ganhou!

Daniel M. Delfino

04/07/2002

Nenhum comentário: