5.11.15

Eleições na Grécia: faz falta uma esquerda anticapitalista e socialista



O repúdio à Troika
No domingo dia 25 aconteceram eleições gerais na Grécia, antecipadas devido ao colapso do governo anterior (liderado pelo partido mais tradicional da direita, o Nova Democracia), conforme as regras do sistema parlamentarista. As eleições foram vencidas pelo partido SYRIZA (Coalizão da Esquerda Radical, na sigla em grego), que assim apontará seu líder Alexis Tsipras para o posto de primeiro ministro. A principal promessa de campanha do SYRIZA é o fim das medidas de “austeridade” que vêm sangrando o país desde a crise do euro em 2010, episódio da crise mundial iniciada em 2008, e que praticamente não se encerrou na Europa.
Para não ser forçada a abandonar a moeda comum européia, o euro, a Grécia se submeteu desde 2010 a um memorando da chamada “Troika” (União Européia, Banco Central Europeu e FMI) que impunha medidas severas de “austeridade”, ou seja, corte nos gastos públicos, para garantir que o governo do país continuasse pagando sua dívida aos credores internacionais e recuperar sua credibilidade perante o mercado internacional. Os cortes nos gastos públicos atingiram pesadamente a população trabalhadora, já que foram direcionados aos serviços públicos, à saúde, à educação, ao pagamento de aposentadorias e pensões. Além dos cortes, houve também aumentos de impostos. Essa política foi maciçamente rejeitada nas urnas.

A tragédia social da austeridade
As medidas de “austeridade” vinham sendo implantadas pelos governos da Nova Democracia e do PASOK (Partido Social Democrata, o partido da “esquerda” tradicional), que têm se alternado no poder nos últimos anos, sem conseguir reativar a economia. Segundo dados do FMI (http://www.imf.org/) de outubro de 2014, o PIB da Grécia está em US$ 246 bilhões, tendo se mantido praticamente estável em 2014 (crescimento de 0,6%), depois de uma seqüência de quedas brutais (-3,8% em 2013, -6,9% em 2012, -7,1% em 2011, -4,9% em 2010 e -3,1% em 2009). A taxa de desemprego está em 25,7% (ou seja, ¼ da população economicamente ativa), sendo 60% entre os jovens de 18 a 25 anos, e a dívida pública está em 168,6% do PIB.
As conseqüências da austeridade e do desemprego são o aumento explosivo da pobreza nos anos recentes: “Com 1,38 milhões de pessoas no desemprego [de uma população de 11 milhões de habitantes], a pobreza tem aumentado na Grécia. Um estudo da Universidade de Atenas revela que no ano passado 14% da população vivia na pobreza, contra 2% em 2009.”(http://pt.euronews.com/2014/02/13/grecia-desemprego-e-pobreza-batem-recordes/).

A busca por uma alternativa política
Nenhum dos partidos políticos, nem o vitorioso SYRIZA nem os menores KKE (Partido Comunista) e ANTARSYA (Cooperação da Esquerda Anticapitalista para a Ruptura), entretanto, tem conseguido organizar a imensa insatisfação popular com as medidas de “austeridade”. Dezenas de greves gerais de 24h e 48h têm sido realizadas desde 2008 (dirigidas pelas burocracias sindicais ligadas ao PASOK e KKE, que assim evitaram um transbordamento das lutas), além de massivas manifestações nas ruas, com pesados conflitos com as forças da repressão, a cada vez que o parlamento grego votava as imposições da Troika. Conflitos abertos tem oposto a esquerda aos neonazistas do Aurora Dourada, que teve sua sede incendiada por ativistas de esquerda depois do assassinato do rapper antifascista Pavlos Fyssas em 2013.
Nesse cenário de crescente polarização social, o conteúdo concreto do programa de Tsipras (apesar de todo o terrorismo da mídia com o fantasma do esquerdismo e a ameaça aos mercados) se limita a uma tímida renegociação da dívida pública, que alonga as parcelas e mantém a sujeição do país ao capital financeiro especulativo internacional. Não se trata portanto de nenhuma solução “radical” capaz de resolver os problemas do país.
A origem da crise econômica grega está na sua baixa produtividade em comparação com as demais economias da zona do euro, em especial gigantes como a Alemanha e a França. O tempo de trabalho socialmente necessário para produzir carros, eletrodomésticos, roupas, etc., é maior na Grécia do que em outros países, o que significa que esses produtos são mais caros, por isso as empresas gregas não conseguem competir e são absorvidas pelas suas concorrentes internacionais, o que resulta em desemprego de trabalhadores gregos. A permanência da Grécia no euro é uma ficção mantida às custas do endividamento do governo grego, já que a produtividade do país é muito inferior à da economia reguladora do bloco, a Alemanha, que assim está colonizando as demais participantes do euro. Esse endividamento, por sua vez, tem sido repassado pelo governo aos trabalhadores.
O governo do SYRIZA não será capaz de romper realmente com a austeridade e reverter o empobrecimento dos trabalhadores, porque para isso teria que tomar medidas realmente anticapitalistas: não pagamento da dívida pública, saída da zona do euro e fim das políticas de austeridade, redução da jornada sem redução dos salários, reativação dos serviços públicos, igualdade de direitos para os imigrantes, estatização das empresas que ameaçarem fechar. Ao invés de chamar voto no SYRYZA, organizar os trabalhadores em torno desse programa deveria ser a tarefa da esquerda grega.

Daniel M. Delfino
Janeiro 2015


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