Há
alguns meses o país foi tomado por uma overdose de notícias
e comentários sobre o julgamento do chamado “mensalão”.
Figuras históricas do PT e componentes do alto escalão
do primeiro mandato de Lula foram condenados no Supremo Tribunal
Federal – STF, pelo crime de subornar parlamentares para aprovar
medidas que interessavam ao governo (entre elas a Reforma da
Previdência, o Supersimples e outros ataques aos
trabalhadores), num escândalo que eclodiu em 2005 e que somente
agora chegou aos tribunais. A mídia deu amplo destaque ao
julgamento e ao anúncio das condenações e penas.
O tom dos comentários era de que o país estava sendo
passado a limpo e se livrando dos corruptos. Os juízes do STF
foram transformados em heróis nacionais, e os partidos
adversários do PT, como PSDB e outros oportunistas, tentaram
explorar o episódio nas eleições municipais.
Agora,
um dos operadores do esquema do mensalão, o publicitário
Marcos Valério, a quem se atribui a autoria do mecanismo que
desviava os pagamentos mensais aos parlamentares (o chamado
“valerioduto”) veio a público envolver o próprio
ex-presidente Lula. Segundo Marcos Valério o ex-presidente
estava ciente de todo o esquema e teve até despesas pessoais
pagas com o mesmo dinheiro usado nas propinas, o qual, segundo o PT,
provinha de sobras de campanha eleitural. As afirmações
de Lula na época, de que “não sabia de nada”, se
tornaram parte do folclore político nacional, mas nem o
mensalão nem os sucessivos escândalos de corrupção
nos seus dois mandatos “colaram” na sua imagem. A maioria do
eleitorado seguiu votando no PT, por identificar na figura de Lula o
responsável por supostas melhorias no país (na verdade,
uma porção maior das migalhas, que o PT foi mais
habilidoso que os outros partidos ao distribuir). Setores da oposição
burguesa liderados pelo PSDB e acompanhados pela mídia em peso
(Globo, Veja, Folha, etc.) simplesmente não se conformam com
as vitórias eleitorais do PT e querem destruir o prestígio
de Lula, que não só elegeu sua suecessora com relativa
facilidade como saiu do governo com a maior popularidade da história.
O objetivo da campanha da oposição burguesa e da mídia
é enfraquecer ainda mais o PT e suas figuras históricas
e inviabilizar a possibilidade de que Lula queira retornar em 2014 ou
2018.
Essa
nova rodada de denúncias sobre o caso do mensalão podem
significar talvez uma divisão entre setores da burguesia em
torno de quem seria o pessoal político preferencial para
administrar o Brasil, o PT ou seus concorrentes. As últimas
declarações do bicheiro Carlos Cachoeira, alvo de uma
CPI à parte e de Marcos Valério mostram como PT está
atolado na lama do poder e virou refém de bandidos. Fica claro
o preço que o partido está pagando para ter o controle
do aparato estatal. Os acordos que o partido teve que fazer para
manter esse controle levam a uma direitização cada vez
maior. Uma vez que optou por governar para a burguesia, o PT se
enreda nas suas armadilhas. O seu principal instrmento de relação
com os trabalhadores, a CUT, ao invés de desencadear lutas de
interesse da classe, serve para manter os trabalhadores em silêncio.
Apesar
de todo esse desgaste, não acreditamos que o PT vá
perder de imediato a sua influência perante os trabalhadores.
Também não acreditamos que o PT deixe de ser a opção
preferencial da burguesia para gestão do país, pois
essa relação privilegiada com os trabalhadores ainda é
necessária para a burguesia, para que não haja grandes
lutas como resultado da deterioração da situação
econômica e social do país. Ainda que não seja
capaz de derrubar o prestígio de Lula e do PT ou mesmo
enfraquecer o governo Dilma, as sucessivas denúncias de
corrupção servem para manter o PT com as “rédeas
curtas”, pressionado a fazer mais e mais favores ao capital. Essas
denúncias não significam que o regime da democracia
burguesa esteja em crise no Brasil, devido a um conflito entre o
judiciário e o executivo. Acreditar que o regime está
em crise poderia levar à conclusão de que o sistema
está enfraquecido e seria incapaz de desencadear ataques sobre
os trabalhadores, o que seria um grave erro de avaliação.
A disputa nas cúpulas do regime não enfraquece a
capacidade do governo de agir e seguir aplicando o projeto da
burguesia. Dilma segue tocando os negócios do Estado como se
“não fosse com ela”, mantendo uma distância olímpica
das questões despertadas pelas denúncias de corrupção,
e cumprindo o seu papel de governar para o capital.
Na época
do julgamento do mensalão, antes mesmo que as denúncias
recaíssem sobre Lula, nós do Espaço Socialista
publicamos uma nota onde afirmamos que: “Toda vez que um esquema de
corrupção é descoberto muitos políticos
juram inocência e dizem que 'é preciso acabar com a
corrupção'; dizem que 'é preciso ter ética
na política' e que 'é preciso passar o Brasil a limpo'.
Só que, a cada dia que passa, o problema só piora, pois
agora todos os partidos – governistas e da oposição
burguesa (PT, PMDB, PSDB, PC do B, DEM, PP, PRP, etc)- estão
envolvidos. Nenhum escapa.”
“O PT,
que carrega o nome de partido 'dos trabalhadores', por muitos anos
disse ser contra a corrupção e defender os
trabalhadores, fez a opção de governar sem romper com o
capitalismo e a dominação dos ricos e poderosos. Com
isso, acabou aceitando a contribuição de empresas para
suas campanhas. Daí foi um passo para que os políticos
eleitos pelo PT passassem a beneficiar as empresas e esquecer as
promessas de campanha. É por isso que as organizações
dos trabalhadores devem ser sustentadas pelos próprios
trabalhadores e devem lutar para destruir todo o Estado atual e suas
instituições, executivo, legislativo, judiciário,
forças armadas, etc., que são usadas contra nós,
e susbtituí-las por organizações controladas
pelos próprios trabalhadores. Chega desse Estado que serve aos
patrões e ainda por cima rouba parte do dinheiro que
produzimos com nosso trabalho!”
“O
problema da corrupção não é simplesmente
das pessoas que ocupam os cargos públicos, o que seria
possível resolver apenas trocando essas pessoas. Nem é
apenas um problema do partido que está no poder, pois já
se revezaram vários partidos no governo e todos eles estão
envolvidos em algum caso de corrupção. Antes era PSDB e
DEM, agora é PT e PMDB. São farinhas diferentes. Umas
mais refinadas; outras, mais grosseiras. Mas, no final das contas,
são farinhas mesmo saco. Todas essas maracutaias constituem o
próprio modo de funcionamento das instituições
do Estado burguês e elas só serão resolvidas
definitivamente quando os trabalhadores tomarem o poder político
e econômico da sociedade. Para acabar com a corrupção,
não podemos ter ilusões nem no judiciário nem
nas CPI´s do Congresso. Não podemos ficar esperando que
o congresso nacional e suas CPI’s que sempre acabam em pizza ou
mesmo que o judiciário acabe com a corrupção.
Para acabar com a corrupção é preciso que nós
trabalhadores nos mobilizemos para exigir medidas concretas ”
Essas
afirmação são diariamente confirmadas por novas
revelações, que agora envolvem a principal figura da
história do PT, o ex-presidente Lula. Desde a primeira eleição
de Lula em 2002 denunciamos a passagem do PT para o lado da burguesia
e fizemos oposição ao seu governo. Na verdade, os
princípios classistas e a defesa dos interesses dos
trabalhadores já haviam sido abandonados pelo PT desde a
década de 1990, para não falar de um projeto
anti-capitalista e socialista, que o partido nunca incorporou de
fato. A coligação com partidos burgueses, a aceitação
de doações de empresas para campanhas eleitorais, as
administrações municipais e estaduais e os mandatos
parlamentares em que já se aplicavam políticas
contrárias aos trabalhadores e favoráveis à
patronal, a prática generalizada da corrupção, a
perda de combatividade da CUT e sua burocratização,
etc., já eram traços característicos do PT há
muitos anos. Os mandatos de Lula, com seus favores aos banqueiros,
latifundiários, industriais, seus escândalos de
corrupção, foram o auge desse processo.
Somos
oposição ao PT de Lula e Dilma e também ao bloco
liderado pelo PSDB e a mídia. Este bloco não tem um
projeto muito diferente para o país daquele que está
sendo aplicado pelo PT. Apenas querem um controle maior sobre a
máquina do Estado e as rendas da corrupção, hoje
sob o domínio do PT. O debate colocado pelo bloco de oposição
burguesa gira em torno do tema da corrupção, com o
discurso de que o PT é corrupto e eles fariam uma gestão
melhor. Mas na verdade o problema do país não é
apenas o fato de haver uma gestão mais corrupta ou menos
corrupta, o problema é o conjunto do projeto a que essa gestão
se refere. A política é tratada como se o problema
decisivo fosse uma gestão mais competente e honesta, mas na
verdade o problema é o próprio projeto que se está
gerindo. A opinião pública é mantida na
expectativa de que surja esse gestor mais competente e honesto, mas
na verdade o que é preciso é modificar globalmente o
projeto, inclusive para acabar com a corrupção.
Tanto o
PT quanto o PSDB têm como projeto tornar o Brasil viável
para o grande capital, às custas dos sacrifícios
impostos aos trabalhadores. Para isso, é preciso desviar
grandes quantias de dinheiro público para as empresas, por
meio de empréstimos a juros subsidiados, isenção
fiscal, pacotes de obras públicas (em que o governo entra com
o investimento e a iniciativa privada fica com os lucros), etc. Como
parte dessa política, acaba de ser anunciado um pacote que
favorece a construção civil, justamente um dos setores
que mais lucraram nos governos do PT. Além disso, é
preciso retirar o dinheiro que iria atender as necessidades dos
trabalhadores, como a saúde, a educação,
transporte, saneamento, etc. Como se não bastasse, há
ataques ainda mais diretos. Por iniciativa do Sindicato dos
Metalúrgicos de São Bernardo, o mesmo que deu projeção
à Lula e foi um dos pilares da fundação da CUT,
está sendo proposto o Acordo Coletivo Especial – ACE, que
permite aos sindicatos assinar acordos abaixo daquilo que está
garantido na CLT. Se esse projeto for aprovado, abrem-se as portas
para que os sindicatos hoje aliados da patronal, como os da CUT,
Força Sindical, CTB, etc., assinem acordos retirando direitos
históricos dos trabalhadores, como 13º, férias,
adicional sobre horas-extras, descanso semanal, jornada de oito
horas, etc. Por aí se percebe o quanto o projeto que está
sendo aplicado no pais só se sustenta por meio de favores às
empresas e ataques aos trabalhadores.
Esses
ataques não consistem apenas de medidas como o ACE, mas de uma
ofensiva geral de repressão, que é aplicada,
principalmente, pelo Poder Judiciário, o mesmo que é
comandado pelo STF. O judiciário colabora com o governo e as
empresas ao julgar ilegais as greves, impor multas aos sindicatos,
punir os grevistas, manifestantes, ativistas e militantes.
Trabalhadores e estudantes que não concordam com as imposições
do Estado e dos patrões são punidos com condenações
judiciais, demissões, processos administrativos, expulsões,
de maneira arbitrária, em processos cheios de falhas, mas que
são validados pelo judiciário. Quando trabalhadores
recorrem à ação direta para lutar por seus
direitos, a polícia ataca primeiro e o judiciário vem
em seguida legitimar a repressão. Os componentes do STF não
são heróis nacionais que lutam contra a corrupção,
são defensores do sistema que diariamente explora e oprime os
trabalhadores, são os mesmos que favorecem os patrões
em ações contra os trabalhadores, os mesmos que
inocentam rotineiramente quadrilhas de corruptos que roubam dinheiro
público, acobertam crimes de colarinho branco, etc. O STF é
parte do sistema, e o judiciário é tão inimigo
dos trabalhadores quanto o executivo e o legislativo. O Estado, já
dizia o Manifesto Comunista há mais de 160 anos, é um
comitê gestor dos negócios da burguesia. Ainda que os
diversos partidos disputem entre si o poder, usando a mídia e
acusações de corrupção uns contra os
outros, todos estão unificados em defesa dos interesses da
classe patronal. Tanto o PT de Lula e Dilma quanto aqueles que o
denunciam no PSDB e na mídia, etc., têm acordo geral com
o projeto que está sendo aplicado no país. Sua
divergência é pelo controle do Estado, e tão
somente.
Existe
um setor que, diante dos ataques da mídia e do PSDB contra
Lula e o PT, dizem que é necessário defender o
“processo de mudança”, as “conquistas” dos
trabalhadores e a estabilidade do governo Dilma, contra a ofensiva da
direita golpista. Somos contra esse discurso, pois entendemos que a
única defesa dos interesses dos trabalhadores está na
sua organização e mobilização
independente. Há décadas o PT deixou de ser um
instrumento dos trabalhadores e como governo tem se esmerado em
defender os interesses do capital. A relação que o PT
desenvolve com os trabalhadores não é de organização,
mobilização e conscientização, mas de
instrumentalização. Tanto os trabalhadores mais
precarizados, desempregados, etc., atendidos via programas de bolsas,
como os setores mais organizados (metalúrgicos, bancários,
petroleiros, correios, funcionários públicos,
professores, etc.) são tratados não como sujeitos
capazes de formular suas próprias reivindicações
e obtê-las por meio da luta, mas como objetos passivos, que
devem ser tutelados pela burocracia petista, no Estado ou nos
sindicatos, e muito agradecidamente votar nos candidatos petistas. É
este o papel que o PT reserva aos trabalhadores, o de seus eleitores,
não o de sujeitos ativos e conscientes que tomam as questões
nas próprias mãos. Nesse sentido, não se pode
falar em “conquistas dos trabalhadores” nos governos do PT, pois
o que houve não foi mais do que míseras migalhas,
administradas sem sacrificar a prioridade que é o pagamento da
dívida pública (50% do orçamento). Esse tipo de
relação não serve para o desenvolvimento da
consciência e organização dos trabalhadores,
contra os ataques que estão sendo desencadeados. As conquistas
dos trabalhadores somente somente são possíveis por
meio da sua organização e mobilização
independente.
Na luta
contra a corrupção, defendemos:
·
Prisão de todos os corruptos e corruptores, bem como devolução
das verbas obtidas ilicitamente;
·
Corte imediato de todos os privilégios! Redução
dos salários dos políticos ao nível do salário
médio dos trabalhadores do país;
·
Revogabilidade dos mandatos. Destituição dos
parlamentares que, a qualquer tempo, votem medidas que prejudiquem os
trabalhadores;
·
Abertura de todas as contas de campanha eleitoral;
·
Tempo igual na televisão para todos os partidos políticos.
Contra a Reforma Política que pretende deixar apenas os
partidos da burguesia;
Daniel M.
Delfino
Agosto
2012
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