5.11.15

Não ao 3º turno: por uma 3ª alternativa, dos trabalhadores!



Durante a campanha eleitoral a candidatura de Aécio Neves atraiu o apoio de um setor de extrema direita composto por saudosistas da ditadura, religiosos ultraconservadores, celebridades midiáticas (Lobão, Danilo Gentili, etc), defensores da proibição do aborto, da criminalização das drogas, da redução da maioridade penal, da pena de morte, etc., representantes do atraso social, do obscurantismo em geral e do ódio contra pobres, negros, nordestinos, homossexuais, etc. O tom ultradireitista da campanha de Aécio se caracterizava menos como uma campanha tipicamente pró-PSDB (partido composto por tecnocratas liberais e porta-vozes diretos da especulação financeira) do que como um campanha anti-PT.

A virulência dessa campanha ultra direitista anti-PT, por sua vez, assustou toda uma camada de simpatizantes das ideias de esquerda e de ex-militantes, neomilitantes e pseudo militantes (categorias que separamos dos militantes tradicionais não como um aspecto diminutivo ou pejorativo, mas pela diferença de que os militantes propriamente ditos estão organizados em coletivos e portanto tomam suas decisões coletivamente), a ponto de que esse setor considerou que a única alternativa contra o perigo dessa ultra direita tenha sido votar no PT. É bastante positivo que todo esse setor que se identifica como simpatizante das posições de esquerda tenha se sensibilizado com a tendência de ultra direitização que se expressou na campanha de Aécio e que tenha tentado de alguma forma combater tal tendencia. A sensibilidade contra a ultra direita e a tentativa de se colocar em luta podem deixar um saldo positivo dessa campanha eleitoral, desde que esse setor não caia numa armadilha, a de se organizar em torno do PT.

É compreensível que este setor tenha feito campanha por Dilma contra Aécio tendo como alvo derrotar a ultra direita, embora não possamos concordar com essa posição e tenhamos deixado isso bem claro fazendo campanha pelo voto nulo. É compreensível diante da falta de uma alternativa real de esquerda, não apenas de um partido em que se possa votar nas eleições, mas de um movimento político real que reúna e expresse as demandas da classe trabalhadora e de todos os seus segmentos, em que os trabalhadores organizados se coloquem como protagonistas. A grande questão é que a reconstrução desse movimento jamais terá como ponto de partida o voto no PT e o apoio às políticas do PT. O PT jamais será uma proteção real contra a ameça da ultra direita.
O PT deixou de ser uma organização de trabalhadores para ser uma organização composta de burocratas que vivem às custas de cargos no parlamento, ministérios e secretarias, das verbas e da corrupção oriundas desses cargos, bem como dos fundos de pensão, aparatos sindicais, ONGs, movimentos sociais, etc. Através dos cargos no Estado e dos fundos de pensão, os burocratas petistas estão organicamente integrados à gestão dos negócios do capitalismo brasileiro juntamente com a burguesia nacional e internacional. Governam o pais há 12 anos buscando contemplar os interesses do conjunto do capital que opera no Brasil. Conseguiram lucros extraordinários para bancos, grandes industrias, empreiteiras, latifundiários, etc. O fato de que uma parte da burguesia tenha desertado para a campanha de Marina e depois Aécio não diz nada sobre o caráter do PT em si, não faz com que por esse fato o PT tenha voltado a ser uma organização de trabalhadores, diz apenas sobre o caráter irracional e imediatista dessa mesma burguesia.
Como dissemos, o PT deixou de ser uma organização de trabalhadores, o que significa que os seus componentes passaram para uma outra categoria social, que chamamos de burocracia. Os burocratas estão há décadas afastados dos processos reais de luta dos trabalhadores e possuem interesses próprios diferentes e opostos aos da nossa classe. Tanto assim que nesses 12 anos de mandato, foram executores ou cúmplices e coniventes com o genocídio de pretos e pobres nas periferias, trabalhadores rurais, quilombolas e indígenas nas fronteiras agrícolas devastadas pelo agronegócio, com a repressão policial às greves, manifestações, ocupações e movimentos de lutas de sem terra e sem teto, as prisões, demissões e perseguições contra militantes e ativistas, etc. Essa repressão foi praticada pelo governo federal e pelos governos estaduais e municipais do PT, e nos casos em que foi praticada por outros partidos, foi com a conivência do governo federal do PT.
O papel do PT como direção da CUT, principal central sindical do país, e dos sindicatos que representam as principais categorias do pais, tem sido o de trair, sabotar e bloquear as lutas. Por isso dissemos que esse partido não pode ser uma alternativa contra a ultradireita. No caso de um novo governo do PSDB, o PT não seria um instrumento dos trabalhadores para lutar contra os ataques, mas ao contrário, ajudaria a classe patronal a impor esses ataques, que estão no programa do próprio PT (aumento dos juros, aumento dos preços da gasolina, da luz, dos transportes, etc.). Já na década de 1990, quando o PSDB governava o pais, o PT praticava a conciliação de classes e levava as lutas dos trabalhadores à derrota, como fez na emblemática greve dos petroleiros de 1995.

Enfim, essa camada de burocratas vive às custas do capitalismo periférico brasileiro, estão a favor desse capitalismo periférico e não de enfrentá-lo. Ao defender o capitalismo, porque é dele que sobrevivem, não tem como apresentar nenhum tipo de projeto, horizonte ou ideologia. Sem um projeto a oferecer aos trabalhadores que possa se contrapor ao capitalismo, é questão de tempo até que as tendências mais destrutivas do próprio capitalismo, como as ideias de direita, comecem a ser referências para os trabalhadores.

O PT não tem um projeto oposto ao capitalismo e por isso não tem condições de oferecer uma alternativa contra as expressões mais barbaras da crise do capitalismo, que são as ideias da ultra direita. As melhorias sociais experimentadas especialmente nos dois mandatos de Lula não são resultado de uma vocação, talento ou capacidade do PT de fazer a economia do país crescer, mas de uma situação excepcional favorável no mercado internacional para os produtos que o pais exporta. Não são uma forma de enfrentamento do capitalismo, mas uma conseqüência das suas flutuações. Podemos afirmar que teriam ocorrido com ou sem o PT. O partido teve a competência de empacotar essas melhorias com um "marketing" de conquistas da sua gestão e deixar uma imagem de serem mais próximos do "social". O seu erro foi justamente acreditar no seu próprio marketing. Acreditar que as ditas melhorias poderiam durar para sempre, ou que a gratidão dos trabalhadores seria suficiente para garantir tranqüilamente infindáveis reeleições.
Nem uma coisa nem outra. As flutuações do capitalismo mundial puseram fim ao ciclo de crescimento da era Lula e impuseram a mediocridade no governo Dilma. E a mediocridade dos ganhos ocorridos nos mandatos do PT (acesso ao consumo via crédito e endividamento, não ganhos salariais reais) não foi suficiente para disfarçar a deterioração das condições de vida dos trabalhadores (inflação, aumento da exploração no trabalho, sucateamento dos serviços públicos), que estão cada vez mais manifestando a sua insatisfação. Reproduz-se no Brasil o mesmo fenômeno de governos pós-neoliberais da América Latina, como o de Maduro na Venezuela e o de Kirchner na Argentina, que também surfaram na onda da alta das commodities, que já se esgotou, diminuindo as margens para as concessões que aliviaram parcialmente a miséria. Em função do esgotamento desse ciclo, o conjunto desses governos tem enfrentado derrotas eleitorais ou resultados muito apertados.
O pós-neoliberalismo se mostra na verdade, em perspectiva histórica, como uma espécie de intervalo ou parêntesis anômalo, uma forma temporária de neoliberalismo heterodoxo, que serve apenas para preparar caminho para a volta do neoliberalismo puro. Um parêntesis que existiu como uma forma de desviar e controlar as lutas dos trabalhadores contra o neoliberalismo puro, que marcaram a virada da década (argentinazo em 2001, guerra da água e guerra do gás na Bolívia, etc.). Essas lutas não conseguiram gestar alternativas politicas próprias dos trabalhadores, por isso foram desviadas para governos pós-neoliberais, oportunistas e pró capitalistas, de retórica vagamente reformista e prática anti reformista. Agora, trata-se de organizar essa alternativa dos trabalhadores já em oposição a tais governos pós neoliberais.
A tentativa petista de administrar o capitalismo periférico brasileiro com benefícios para os andares extremos da piramide social (super lucros a elite burguesa e alívio para os miseráveis) as custas dos trabalhadores e camadas médias esta chegando ao fim. O PT vai ter que escolher um lado, e será o da burguesia.

Daniel M. Delfino

Outubro 2014

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