A
situação do abastecimento de água na região
da Grande São Paulo tem sido discutida há vários
meses, desde que os reservatórios do sistema Cantareira, que
abastece cerca de 6,5 milhões de habitantes atingiram um nível
crítico. No momento, o nível das reservas é de
10,7%. O sistema Tietê, que abastece outros 4,5 milhões
de pessoas na região, está com apenas 15,2% de
capacidade. A falta d'água, como não poderia deixar de
ser, tornou-se mais um dos temas de debate no período
eleitoral. De um lado, o governador e candidato à reeleição
Alckmin, do PSDB, diz que a causa do quase esvaziamento dos
reservatórios é a falta de chuvas. De outro lado, os
candidatos opositores apontam as falhas na gestão do governo,
que comanda a Sabesp, empresa responsável pelo abastecimento.
Na verdade, ambos estão errados.
A culpa
é do capitalismo...
A falta
d'água em São Paulo não é apenas um
problema de gestão, que poderia ser resolvido por uma
administração mais competente. Afinal, a falta de
chuvas é real. O estado de São Paulo enfrenta a maior
seca desde 1969. A estiagem em São Paulo não é
um fenômeno isolado e de âmbito apenas local. A mudança
climática é um processo global, que resulta em vários
tipos de desequilíbrios, como secas, inundações,
ondas de frio ou calor, tempestades, furacões, nevascas,
efeito estufa, etc., em várias regiões do planeta.
Essa
mudança climática que estamos vivenciando nas últimas
décadas é resultado do acúmulo de séculos
de intervenção humana no meio ambiente, em particular a
partir da Revolução Industrial. A queima de
combustíveis fósseis, a extração de
minérios e outros recursos, a derrubada de florestas e matas
nativas, a extinção de espécies animais e
vegetais, o esgotamento da fertilidade dos solos pela agricultura e
pecuária intensivas, o despejo de poluentes na terra, nas
águas e no ar, o lixo, a impermeabilização dos
terrenos pela urbanização, destruição de
margens de rios e mangues, etc; tudo isso vem acontecendo há
séculos de uma maneira descontrolada, irracional,
inconsequente. Isso inevitavelmente provocaria mudanças no
equilíbrio ecológico e climático do planeta, com
as consequências que estamos vivenciando hoje, e que não
serão facilmente reversíveis.
Mas o
problema não foi o simples aumento da capacidade produtiva da
humanidade, o que em termos da história da espécie é
uma vitória sobre a natureza. O problema é que esse
aumento das forças produtivas não foi aproveitado de
maneira racional para atender as necessidades humanas, e sim para
aumentar o lucro capitalista. A forma mercadoria é a forma de
todos os produtos da atividade humana no capitalismo, o que significa
que esses produtos são produzidos não porque atendem a
alguma necessidade, mas para que possam ser vendidos, e assim
realizar e multiplicar o seu valor mercantil.
No auge
da sua irracionalidade, vemos esse sistema produzir milhões de
automóveis, que não podem circular porque provocam
gigantescos engarrafamentos, milhões de eletrodomésticos
que são jogados no lixo com pouco tempo de uso para serem
substituídos por novas bugingangas, toneladas de alimentos
sendo desperdiçados e quase um bilhão de pessoas
passando fome porque não podem pagar pela comida, prédios
e apartamentos sendo construídos e pessoas sem ter onde morar,
milhões de trabalhadores adoecendo física e
psicologicamente por excesso de serviço e outros milhões
desempregados. Para o capitalismo, é indiferente que as
mercadorias atendam ou não a alguma necessidade, o que importa
é que sirvam como suporte para a multiplicação
do valor. Por isso, vivemos uma overdose de mercadorias (e de
miséria) e alterações no equilíbrio
ecológico global. A produção capitalista é
uma produção destrutiva.
...o
capitalismo privatizou a água
Se o
sistema capitalista em escala global pode ser responsabilizado pelos
desequilíbrios climáticos e a falta de chuva, esse
mesmo sistema e sua lógica do lucro a qualquer custo destroi
as possibilidades de lidar com a falta de chuvas na escala local. No
Brasil, de acordo com as definições da lei, a água
em si não pode ser vendida como mercadoria. As empresas que
fazem o abastecimento podem cobrar pelo serviço de tratamento
e distribuição. É esse custo que vem na conta
d'água que todos pagamos. Para prover esse serviço,
essas empresas porcisam receber uma concessão governamental, e
para isso precisam se comprometer com uma série de condições.
Na
região da Grande São Paulo a empresa responsável
por esse serviço é a SABESP, uma empresa de economia
mista, com maioria acionária pertencente ao governo do estado
e o restante das ações nas mãos de investidores
privados. A concessão da SABESP para fornecer o tratamento e
distribuição de água em mais de 300 cidades do
estado de São Paulo foi renovada pela última vez em
2004. Na renovação ficou estabelecido que a SABESP
tinha a obrigação de investir em estações
de tratamento de esgoto, aumento dos reservatórios e
manutenção dos encanamentos (um terço da água
se perde em vazamentos, segundo a própria SABESP). Para
comprir com essa obrigação, a empresa teria que fazer
pesados investimentos.
Ao invés
disso, a SABESP pagou R$ 500 milhões como lucro aos seus ricos
donos somente este ano. Entre 2004 e 2013, foram ao todo R$ 4,8
bilhões! Isso quer dizer que alguns poucos estão
lucrando com a desgraça e a falta d'água de outros!
Contra o
capitalismo e pelo socialismo, para salvar a humanidade!
Há
várias regiões da Grande São Paulo em que já
falta água, vários bairros e cidades recebem água
dia sim dia não, ou por apenas algumas horas do dia.
Curiosamente, essas regiões ficam nas periferias, enquanto que
nos bairros centrais e de alta renda, onde mora a burguesia, nunca
falta água. E ainda mais curioso, a palavra racionamento está
proibida. A imprensa é tão chapa branca e servil ao
PSDB que não pode usar a palavra que descreve a atual
situação. Não se pode assumir que há
racionamento da água, porque isso poderia prejudicar a
candidatura do tucano à reeleição.
Enquanto
os políticos e capitalistas lucaram, a população
sofre. É preciso tirar a SABESP das mãos dos
empresários e torna-la pública e sob controle dos
trabalhadores! Só assim poderemos ter o aumento dos
investimentos em tratamento de esgoto, reservatórios e
encanamentos! Defendemos a reestatização da SABESP, sob
controle dos trabalhadores e da população.
Provisoriamente, enquanto não se restabelecem as reservas, é
preciso aplicar o racionamento, mas que ele atinja por igual todas as
regiões, e não apenas os bairros pobres e periféricos.
Racionamento também nos bairros burgueses!
E
finalmente, é preciso também ficar claro que a solução
para os problemas ambientais só será possível
com o fim do capitalismo. Isso porque o meio ambiente é um
sistema planetário, os diversos ecossistemas locais estão
interligados e interagem uns sobre os outros. A poluição
numa determinada região pode provocar falta de chuvas em
outra, e assim por diante. Enquanto houver capitalismo haverá
destruição ambiental. A regeneração do
ecossistema planetário, de uma maneira que possa suportar a
vida humana, só é possível por meio de ações
cooordenadas mundialmente. E o sistema capitalista é incapaz
desse tipo de coordenação, já que está
estruturado sobre a base da dominação de uns sobre os
outros e do conflito de todos contra todos, tanto entre países
e coletividades como entre os indivíduos.
Cada vez
mais, o socialismo, sistema baseado nas decisões coletivas
sobre o que produzir e como produzir, é uma necessidade para a
própria sobrevivência da humanidade.
Daniel M.
Delfino
Setembro
2014
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